03/11/2009
ENCONTROS E DESENCONTROS
A pequena empresa onde trabalhava passava por sérias dificuldades. Havia a necessidade urgente de um vendedor dinâmico que enfrentasse o mercado reticente para o produto ofertado (venda de anúncios).
Um dia, inesperadamente, esse vendedor apareceu. No começo, como quem pouco quisesse, com postura humilde, propôs-se a desenvolver novos clientes.
Com o passar dos dias, seu trabalho começou a dar resultados e, a cada êxito, sua personalidade ia se modificando na mesma proporção.
Passou a pedir pequenos adiantamentos por conta de comissões.
Esses adiantamentos foram subindo de valor, chegando o momento em que a situação tornara-se insuportável.
Todos na empresa passaram a "dormir e acordar" com ele. Era envolvente, convincente, com fortes marcas de mau caráter. Era tênue a linha que o separava da gatunagem pura e simples. Talvez fosse contido pela religião que afirmava professar. Ele conseguira ser a preocupação número um de todos. Eram comuns comentários como:
- Ontem "fui dormir" com o M.., sonhei com ele e "acordei" com ele!
Essa opressão psicológica que ele exercia, por um fenômeno qualquer de sua personalidade, tirava algo de todos. Sua presença tornara-se insuportável, ‘vampiresca’.
Alguns meses, quando o clima se tornara de tal ordem negativo, num daqueles estouros inevitáveis, um murro na mesa, de vez em quando necessário, foi posto a correr.
Muitos anos se passaram. Um dia, no centro de São Paulo dei de cara com ele. Tentei evitá-lo, mas ele fez questão em se aproximar.
Disse apenas:
- Olha, criei juízo...
Balbuciei qualquer coisa, perplexo com a afirmação, logo ele a quem expulsara do ambiente para bem de todos, de mim principalmente. Que tipo de juízo criara? Como poderia ter extraído de si aquela sua marca opressiva? Que reflexão fizera? Sem mais uma palavra, desviou-se e se foi. Quem sabe, realmente "criara juízo". Jamais o esquecerei, porque ele significou na vida de algumas pessoas e na minha própria, por certo tempo, um desencontro. Aquele que finge dar, mas que só tira.
Há pessoas que, efetivamente, num dado momento, entram na vida de outras, provocando grandes provações e dissabores Às vezes de forma inexplicável. E depois desaparecem, se vão, da mesma forma como vieram, deixando, porém, o gosto amargo da lembrança.
São os desencontros. São as pedras que rolam, se chocam e se batem. Mas, não são somente pedras que rolam e se batem.
Há momentos que elas se aproximam, aquelas pessoas que nos momentos mais difíceis também de forma inexplicável, se apresentam e fazem um bem imenso a outras, um simples gesto, falando qualquer coisa oportuna que enleva, que recupera.
Uma palavra pouco machista nos dias de hoje: a ternura. Isso mesmo! É o que algumas pessoas transmitem, sem afetações, com sinceridade e de tal ordem que muitas vezes somente a gratidão não é suficiente para compensar as benesses recebidas. E o mais curioso é que não se dão conta do que fizeram.
São os encontros. Os reencontros. O retorno a algum passado que parece vivido mas perdido, quem sabe, nos séculos, no éter.
Quando faço uma reflexão dos desencontros e encontros, chego à conclusão que nesta vida atribulada, até agora, conto mais encontros, reencontros. Que permanecem em minha mente como momentos preciosos, de amizade. Quanto de amor há na amizade?
Se os desencontros foram maiores, tento não me convencer disso até porque tenho consciência de minha obrigação de perdoar e relevar. Difícil, mas ver o lado bom do atrito das pedras.
Foto: abracadabra.weblog.com.pt
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