Nos blogs que ainda detenho, de fácil acesso, são dezenas de artigos nessa linha ecológico-ambiental, mas publicado na imprensa regional dos quais recuperei três deles.
Os artigos são estes:
Os tempos de infância, lembrava-se saudosos. Afinal, chegara aos 80 anos e surpreendia a todos por sua incrível lucidez e disposição.
Quando lhe perguntavam qual o secredo, não respondia muito naqueles padrões normalmente atribuídos a outros idosos: "muito vinho e alegria", "comi tudo que tinha direito..."
Sua resposta era:
- Não fumei jamais, bebi pouco e ando bastante, dando preferência em visitar áreas verdes. De há muito minha dieta de carne é quase nula. Se isso for realmente uma receita de longevidade, não sei. Mas, eis-me aqui.
- Como assim:
- Bem, o cigarro encurta a vida, o vinho faz, ainda, parte dos meus dias solenes, o verde cuidado tem algo de divindade e quanto à carne tenho muito dó dos animais. Nem quero pensar no terror dos matadouros.
Nas suas meditações sobre a longa existência, retornava à juventude e mesmo à infância, sem qualquer rigor cronológico. Algumas cenas lhe martelavam a mente e o coração.
Nesses momentos, entrava num processo nostálgico, saudoso, até um pouco confuso. Sua infância relativamente feliz, o retrato mental de sua mãe que falecera quando ele tinha apenas 9 anos eram imagens preciosas. Pareciam um sonho. Será que não eram mesmo? Momentos de felicidade, geralmente fugazes, não ficam na mente como um sonho?
Coisa
estranha envelhecer :
-
Sermos sempre nós mesmos e, no entanto, não sabermos explicar, ou
entender esse evento irreversível da velhice e mesmo da morte.
Meus ídolos estão indo embora antes de mim.
Completados 80 anos – a mesma idade de seu pai -, tomara uma decisão: de trem, meio em segredo para não despertar os cuidados dos filhos e netos - era viúvo - voltaria à cidade natal e, no casebre onde tivera uma inesquecível experiência em sua infância, faria uma reflexão. Seria como que uma despedida daqueles velhos tempos de ternura que ainda o emocionavam tantos anos depois.
Sim, seria bom fazer uma oração no casebre, velho casebre se ainda preservado, sombreado por três gigantescas árvores.
Lembrava-se bem. Num dia de chuva pesada, refugiara-se no casebre invocando emocionado a imagem de sua mãe. Num dado momento, porém, em vez de estar encostado na rústica parede da pequena habitação, ouvindo a chuva descendo pelo telhado mal conservado, viu-se recostado no colo de sua mãe, recebendo dela, carinho, beijos na têmpora e frases de que onde se encontrava, não estava morta e, de lá, zelava por ele.
Não se assustou com a presença de sua mãe. Somente as crianças, naqueles tempos em que crianças eram crianças, podiam compreender momentos como esse. E não chorou mais, porque sua mãe, serena, sem as marcas da insidiosa doença que a consumira, assim pedira.
Com tudo isso em mente, tentaria retornar àquele local de árvores agora centenárias e seus passarinhos soltos, pipilando alto a liberdade sem a entender. Certamente a última visita àquelas paragens onde fora feliz ao lado dos seus pais e irmãos.
No dia seguinte, bem cedo, com sua velha Bíblia na mão, livro que começara a conhecer, conforme planejara, tomou o trem, rumando para sua cidade. Deixara um breve bilhete para sua filha. Viagem longa, cansativa, facilmente suportada, porém, pela sua disposição conseguida por caminhadas regulares.
Chegou no fim da manhã. Apressadamente, para aproveitar o sol, tomou o ônibus que o levaria àqueles sítios de sua infância.
Depois, pensaria no pernoite, provavelmente na casa de um sobrinho, se houvesse tempo para localizá-lo. Caso contrário, o hotelzinho da cidade seria a solução.
Mais
meia uma
hora e pouco
de viagem, eis que chegou ao ponto de desembarque. Desceu ansioso do
veículo, notando que havia, ainda, muitas paisagens de sua época. O
riacho que agora abastecia a cidade, embora mais poluído, a
igrejinha da comunidade num ponto mais alto, branca e todos aqueles
sítios.
Caminhou
a pé até a propriedade que fora um dia de sua família. Quando
venceu a pequena subida, algum sentimento de perda antecipadamente
lhe apertava o coração. A decepção fora terrível. Não encontrou
mais suas árvores centenárias, mal reconhecendo o local do casebre.
Uma estrada de ligação de sua cidade, com a rodovia principal
passaria por ali: “a
natureza dera lugar ao progresso”,
pensou, inspirando-se numa placa que lera nalgum lugar algum
dia.
Com profunda mágoa, aproximou-se do local onde certa vez fora consolado por sua mãe sem dar atenção às máquinas ruidosas que se movimentavam arrancando árvores ainda, emocionado, ajoelhou-se no chão de terra batida.
Olhou
em sua volta, viu
a violência,
via as máquinas embaçadas pela
fumaça ou por
seus olhos úmidos como
um pesadelo. Como não previra ou compreendera que o progresso
poderia chegar um dia àquelas plagas?
Sob os olhares atônitos dos operários simples que ali estavam, naquele chão batido, sem grama ou eras, sem a sombra das árvores, fez sua reflexão.
Abriu
ao acaso sua Bíblia - como
aprendera em aulas de filosofia; a professora assim fazia e num tipo
de jogo incentivava os alunos a encontrarem sentidos mais profundos
aos versículos assim abertos - e
em Isaías 60:18, leu em silêncio a mensagem que não entendera bem
mas que a relendo, a entendera plenamente:
"Nunca mais haverá violência na tua terra; de desolação ou destruição nos teus termos; mas aos teus muros chamarás salvação; e às tuas portas louvor".
- Eu sei qual será minha terra, meu Deus. E as portas que louvarei.
É a história do robô mudo Robbie, espécie de ama-seca da menina Glória com quem interage como se humano fosse.
A mãe de Glória implica com a máquina que poderia ser perigosa até o ponto em que Robbie é devolvido ao fabricante.
Glória sofre muito com a separação, sempre esperando que Robbie volte:
— "Por
que está chorando, Gloria? Robbie era apenas uma máquina, uma
máquina velha e feia (...)
— “Ele 'num' era
nenhuma máquina!”, gritou Gloria ferozmente. Ele era uma ‘pessoa’,
como eu e você; e era meu amigo. Quero Robbie de volta."
Até que depois de um tempo por injunção do pai a família visita a fábrica para mostrar à menina que os robôs não passavam de máquinas que se movimentavam.
Quando Glória, ao longe, avista Robbie, corre em sua direção sem perceber que perigosamente se aproximava um trator pesado na iminência de atropela-la mortalmente.
Robbie avança e a salva a tempo.
O robô já
obsoleto, então, é aceito de volta à casa cuidando da menina
Glória.
Esse conto de Assimov fazia muito sucesso entre os meus filhos pequenos.
Logo na abertura, o livro dá a conhecer as
três leis da robótica:
1) um robô não pode ferir um
humano ou permitir que um humano sofra algum mal; 2) os robôs devem
obedecer às ordens dos humanos, exceto nos casos em que tais ordens
entrem em conflito com a primeira lei; e 3) um robô deve proteger
sua própria existência, desde que não entre em conflito com as
leis anteriores.
Será que essas leis serão, afinal, cumpridas?
Porque, além da robótica e da automação, a inteligência artificial, hoje, avança com a celeridade nunca pensada.
No meu artigo, "Temas de Relações Trabalhistas" publicado em março de 1983 na Revista Jurídica LTr, entre os vários temas de interesse me referi ao avanço da automação e introdução de robôs nas linhas de montagem da indústria automobilística.
Tudo nesse tempo e nesse tema havia lá suas desconfianças, descrenças e até "profecias".
A introdução dessas máquinas trazia indagações até ilustradas com um acidente do trabalho fatal que chamaria a atenção para o "milagre japonês" e seu eficiente sistema de robôs, que já ia sendo a implantado intensamente. A morte do operário japonês Kenji Urada, de 37 anos, for noticiada com detalhes:
"Urada morreu quando tentava consertar um requintado robô, vendido ao preço de 46 mil dólares (...) que distribui peças a máquinas montadoras de caixa de câmbio para automóveis e pode ser programado, ainda, para trabalhos de soldagem e pintura. E morreu por ter desrespeitado normas básicas de segurança. Ele pulou a corrente que circunda o robô a alguns centímetros do solo — quando o correto seria utilizar-se de uma portinhola que, aberta, o desativaria de imediato. O operário preferiu desligar a máquina com as próprias mãos, mas, depois, tocou inadvertidamente no mesmo botão. Colhido no peito pelo braço de aço do robô, Urada teve morte instantânea". (1)
Os robôs nos meios de produção geraram polêmica. Os sindicatos reconheciam que a automação tendia a substituir trabalhadores. Alguns setores industriais foram adotando robôs apenas para atividades insalubres ou penosas.
Mas, essa tecnologia com os resultados que trazia (e traz) não ficara só nisso.
Em meio à essa polêmica anunciaram-se estudos identificadores do impacto dos robôs sobre a mão-de-obra, com intuito de determinar regras para sua implantação.
Nunca soube desses estudos e quais regras, tanto que os robôs devagar foram sendo instalados em diferentes atividades da produção, especialmente na indústria automobilística.
Já se disse eu digo tanto quanto, que os robôs são incansáveis, o seu ambiente é limpo, não são sindicalizadas, não descansam, não fazem greve e são extremamente lucrativos, porque não há salários e não há encargos adicionados.
E o que nos reserva o futuro com o avanço dos robôs?
(...) no fim deste século, a máquina terá provavelmente alcançado o "homo sapiens". "Dentro de 20 ou 30 anos — diz Hans Moravec, "pai" do robô de nove olhos — as máquinas serão tão inteligentes quanto nós.
E concluía:
"A longo prazo os humanos não terão outra coisa senão abdicar". (2)
Essa "profecia" é de 1981.
Nesse diapasão, a automação e os robôs nas empresas dos mais variados ramos tornaram-se realidade irreversível.
Os homines sapientes naquelas profissões menos especializadas, foram substituídos em larga escala, não por abdicação, mas por exoneração inevitável. Os robôs fazem com precisão milimétrica inumeráveis atividades antes desenvolvidas por dezenas de profissionais.
Quando escrevi aquele artigo, em 1983 havia poucos meses, eu deixara de trabalhar na Chrysler do ABC que encerraria suas atividades logo depois. As instalações foram adquiridas pela VW.
Naquela
oportunidade confirmei a minha "suspeita" de que essa
tecnologia haveria de ter forte impacto sobre o mercado de trabalho e
sobre a mão de obra num nível mundial.
Os fatos hoje revelam tais mudanças de modo impressionante.
Nessa massa de desempregados, quantos foram afetados pela generalizada automação que se dá no mercado industrial?
Na década de 80 a VW, por exemplo, tinha cerca de 35 mil empregados, não menos que isso. Em 2022, apenas 8.200. Essa redução de efetivo não tem a ver com eventual "diminuição da demanda" da marca mas, sobretudo, com a automação.
Esse quadro é uma realidade.
Mas, não só isso, estamos caminhando céleres para a Inteligência Artificial – AI.
Há filmes de ficção que exploram o domínio da inteligência artificial sobre as ações e sobre a inteligência humana e, nesses casos, os robôs ignoraram aquelas três leis da robótica de Asimov.
O mais emblemático é o filme de Stanley Kubrick, "2001, uma Odisseia no Espaço" de 1968.
Nesse filme admirável, estabelecera-se, então, uma viagem interplanetária para Júpiter, cuja nave seria toda controlada por um computador poderosíssimo, o Hal 9000, infalível, revelando "sentimentos", especialmente o da arrogância. Ameaçado de ser desconectado, depois de um erro inexplicável na missão, tornou-se rebelde e assassino da tripulação sendo por fim desligado pelo último sobrevivente.
Há filmes nos quais os robôs são muito mais cruéis e desdenham da mortalidade inevitável do ser humano.
Um deles, "Alians Covenant" de 2017 do diretor Ridley Scott.
Diálogo entre o criador do robô e o próprio robô batizado de Davi inspirando-se na imagem de Davi, a escultura perfeita de Michelangelo:
—
Eu sou o seu criador, você me deve obediência.
— Se
você é meu criador, quem o criou? pergunta o robô.
— A
dúvida é de onde viemos...
— Mas, como humano,
você é mortal e eu sou imortal.
— Davi me sirva
um chá, agora, ordena o criador, para confirmar sua
autoridade.
Davi obedece.
O robô Davi seria
escalado para assessorar missões interplanetárias e se revela
cruel, inclusive cultivando 'óvulos' de "xenomorfos",
aqueles monstros horrorosos, violentos e carnívoros do tipo visto no
filme "O oitavo passageiro".
Davi desdenhando dos
homens: "Eles são humanos, eles morrem."
Mas, abreviando o tempo dessa discussão no meio científico indagam-se as consequências do aperfeiçoamento da IA — Inteligência Artificial do controle da informação, da desinformação, da liberdade de pensamento, do controle político mencionando-se mesmo os riscos à democracia.
No mundo do trabalho há estudos não otimistas (Goldman Sachs) dando conta que a AI poderá diminuir 300 milhões de empregos no mundo à medida que essa nova tecnologia for avançando.
Quem, afinal de contas, controlará esse poder imenso que pode resultar do aperfeiçoamento da IA?
Nas várias atividades que pode responder a AI há a possibilidade de manifestar algo parecido com o sentimento humano, nas suas virtudes e tragédias.
Num artigo publicado no The New York Times, num trecho se lê:
"O que significaria para os humanos viver em um mundo no qual uma grande porcentagem das narrativas, melodias, imagens, leis, políticas e ferramentas é moldada por inteligência não humana, que sabe como explorar com eficiência sobre—humana fraquezas, vieses e vícios da mente humana — ao mesmo tempo que sabe formar relações íntimas com os seres humano?" (3)
Essas proposições não seriam mais ficção, como a convivência da menina Glória e seu Robbie no livro de Isaac Asimov.
E essa IA não necessariamente seguirá os princípios morais da "lei da robótica".
Fora já "profetizado", como acima mencionado, que os humanos com essa tecnologia não terão outra coisa que não seja "renunciar".
Nesse mesmo artigo do TNYT, é esclarecido que numa sondagem feita em 2022, entre mais de 700 acadêmicos e pesquisadores, metade deles "declarou que existe uma chance de 10% ou mais de extinção da humanidade (ou alguma insegurança similarmente permanente e grave) provocada por sistemas de IA." (3)
Dai porque nessa perspectiva que até pode-se dizer sombria, há muitos que se preocupam com a evolução dessa "inteligência" exatamente pelas mudanças severas de paradigmas na vida de todos como indagamos linhas acima. E pedem cautela às experiências que avançam.
Pensando bem, já não estamos renunciando?