13/05/2012

IDADE

Nas minhas várias manifestações de temas, não poucas vezes me referi ao avançar da idade e o quadro de perplexidade que daí surge à medida em que ela se sucede desenfreada, inexorável e velozmente, pelo que a preocupação com o significado de tudo, das experiências, da vida e...da morte.
Tenho um refúgio em Águas de São Pedro, no interior de São Paulo, cidade com seu verde exuberante. Nem sempre preservado como deveria ser. Esta tarde o tempo está fechado o que me remete aos meus tempos jovens, nestas mesmas tardes, mais intensas, porém.


Agora aprecio as árvores e os arbustos floridos neste meu recanto, não de descanso, mas de meditação. Talvez apenas o descanso da alma. Estar comigo. Sei que nesses momentos se pode atingir algo de universal. Quem sabe algumas luzes se iluminem num lampejo.
Não fujo da realidade, porém, mas o passado está comigo, como disse e tenho dito.

Olhas para trás e o que vês?
Apenas um passado de sombras?
Ou há luzes que oscilam tênues?
O que fazer com tais obras?

Não há como delas escapar,
Mas, estás em silêncio aqui e agora
Perplexo com clamores e decepções
Que revolvem a mente e tudo explora?

Respiro neste silêncio um sentido de paz interior. Lá fora, além das nuvens me deparo com pássaros saltitando num pequeno gramado. O que são eles senão a inspiração dessa paz? Um brinquedo leve da Natureza?


Desconfiados, quando aparo a grama, bem-te-vis ficam por perto caçando os insetos que estranham a perda da proteção e saem à luz. Por que não se aproximam, não chegam até mim?
Seria o auge da poesia aplicada! Uma realização.

Inspira-te nos pássaros à tua janela
Que sobrevivem em árvores desalinhadas
Aproximaram-se do cinza das cidades
Encontrando vãos para suas ninhadas.

Nesta minha idade sou chamado ao perdão. Em perdoar a todos. Enterrar essas mágoas que a nada mais levam. Estou lá, mas o meu presente me clama ao perdão. Conseguirei, superarei os rancores, há mágoas, eu sei, que me marcaram pela vida. O tempo da reconciliação como filho e como pai.

O que és agora nasceu naqueles idos
Naqueles dias de alegria, dúvidas e solidão
Caminhas, sabes, para a frente, para além,
Mas, ressurgem nos sonhos apelos, a emoção!

O que fazes com tais angústias que te assaltam?
Com tantos sentidos de nostalgia e desamor?
Basta viver cada hora, ouves...cada dia
Neste mundo sem tréguas, cruéis e de...amor!

Não serei ingênuo em ignorar este meu tempo de horrores, de contradição e que me assalta. Eu vivo nele e nele sobrevivo. Quantas vezes gritei alto, dolorosamente, “o que mais terei que ver nesta loucura?” Essa vontade de desaparecer, de abreviar o meu próprio tempo. Mas, não, miro-me na minha existência e recebo a resposta: “não ainda não realizei tudo o que quero (ou preciso?), ainda que pouco seja a realizar.”
A minha idade! Minha antiga...idade!

Sabes que nestes tempos de agora
São tempos de soberba e de devastação
Os horrores se multiplicam assustadores
Rareiam os gestos de tolerância e devoção

Essas contradições que te assaltam
Falsas virtudes que te afagam
Apele para o que te resta de superação
Aquilo que estes tempos duros apagam.

Muitas vezes, ah, a minha idade, pela manhã, às vezes lembranças tênues de sonhos insondáveis de há pouco, sobrevém aquela angústia do dia a ser vencido com seus desafios. Melhor que eu ficasse num ócio consciente, se tal fosse possível, com o que do céu enxergo, esses recantos de beleza que ainda vejo erguendo os olhos, árvores altas e floridas em volta, o meu coqueiro que dá coco, lembranças de minha cadelinha preta que não recebeu de mim todo o amor que deu...

...minhas pequenas orquídeas, minhas violetas, begônia “eterna” num cantinho que bem as protege. Extremas simplicidades.
Mas, não!
Saio para o tempo tentando encontrar qualificativos na divergência, vencer os revezes efêmeros e as vitórias também efêmeras e no final do dia, uma certa dignidade pelo enfrentamento a que me obriguei.
O que é viver nestes dias tensos, pois?

Significa não ignorar o quê em tua volta
Não significa a tudo relevar e renunciar
Não é essa uma atitude sóbria, sábia
Contra tal corrente há que resistir e lutar.

Este é um apelo solene que eclode, então
Não desistas do amor e da reconstrução
Reaja às desolações e às perdas
Porque nestes tempos tudo clama ação.

Nunca me imaginei chegar a estes tempos que para mim, neste passado que está comigo, jamais pensei que chegasse. É que eram tempos tão distantes, inatingíveis, sequer pensados. Não pelo receio da vida que se extingue e se extinguirá a qualquer momento. Naqueles tempos não havia morte, apenas a imortalidade da graça vivida.
Eis-me, aqui, agora, porém. Apenas mortal. Algum dia, uma tênue e efêmera lembrança.


Fotos (Não são de paisagens de Água de São Pedro, embora existam lá até com maior beleza):
1a. Azáleas e arbusto - Foto de Milton Pimentel Martins
2a.  Gramado "frequentado" por bem-te-vis quando aparada a grama
3a. Ramos de tipuana e espatódia entrelaçados - Foto de Milton Pimentel Martins
4. Canto das orquídeas, violetas e begônias. Já inseri fotos semelhantes em outras crônicas. 

TEMA CORRELATO: "O SENTIDO DA VIDA" DE 19.07.2013

3 comentários:

HELENA AFONSO disse...

OS SEUS VERSOS precisam de ser lidos e relidos... tanta verdade eles dizem!
MEDITAR E REFLECTIR, eis a solução, no passado, no presente e no futuro...... a CHAVE DA VIDA!
PARABENS MILTON
HELENA

TEMAS LIVRES disse...

Helena
Grato pelas suas palavras. Elas são um incentivo valoroso para mim. Quanto ao texto, reflete minha perplexidade com o tudo da vida. Sds. Milton Martins

Caio Martins disse...

Taí, Milton... já não somos mais imortais. Mas, sempre valerá a pena gastar o tempo restante com flores e passarinhos. Forte abraço!