De Érico Veríssimo, escritor gaúcho (Cruz Alta, 1905 – Porto Alegre, 1975) li meio descompromissado, porque o autor, pela minha ignorância, não me dizia
muito, suas obras seguintes:
A Vida de Joana D’ Arc
Olhai os lírios do campo
O Senhor Embaixador
Incidente em Antares
Solo de Clarineta (2 volumes).
Esses livros que li do brilhante autor, tanto tempo faz, que tenho
apenas fragmentos dos seus temas e enredos – salvo sobre Joana D’Arc porque se
trata de história que sempre me interessou e já me vali de outras obras. Teria
que recolocar, então, esses livros na minha fila de prioridades, porque os
tenho comigo.
Nestes tempos, após enveredar por diferentes temas literários,
voltei-me para minha pequena estante, e lá estavam, como estão, aguardando o
merecido desvendamento ainda da saga “O tempo e o vento”:
O Continente – Volumes 1 e 2
O Retrato – Volumes 1 e 2
O arquipélago – Volumes 1 a 3
Há pouco acabei de ler o 1° volume de “O Continente” que me
surpreendeu muito. Nesse livro há um pouco de tudo, muito bem entrelaçado:
traição, paixão, aventura, guerra, assassinato, sensualismo com “um certo
capitão Rodrigo” e todos os ingredientes de um romance que empolga em todas as
suas páginas.
Já lido também o 2° volume, achei curiosa uma
“constatação” do Autor referente às refeições lautas servidas nas casas
abastadas lá pelos idos da primeira metade do século XIX nas quais não havia
“nenhuma verdura”:
“Winter [o médico] olhava admirado para aquilo tudo. Era simplesmente
assustadora a quantidade de pratos que havia nas refeições das gentes
remediadas ou ricas da Província. Nunca menos de seis, e às vezes até dez. Não
raro numa refeição serviam-se quatro ou cinco variedades de carnes e nenhuma
verdura.”
E depois ainda viria mandioca frita. É pouco?
Parto para a provocação: no grande Rio
Grande do Sul, as coisas não continuam assim mesmo? Há tempos, em duas
oportunidades, participando, sem dele nada experimentar, de um churrasco
em Porto Alegre num meio-dia quente de sábado, um amigo me provocava insistindo
que eu experimentasse um torresmo feito um cubinho todo de gordura suína – se
espremido verteria gotas de colesterol “in natura” ; numa outra vez, para
comer algo, já que pouco ou nada comia nas terras porto-alegrenses, numa noite fui
a uma pizzaria; não me dei bem, restaurante à meia luz com uma turma
jovem reunida na cerveja e nada da comida italiana, é claro. Ainda assim, pedi
a pizza que se revelou ruinzinha. Os circunstantes que ouviram o pedido me
olharam intrigados imaginando de qual planeta eu procedia.
"O Arquipélago" - 3 volumes
Estou encerrando a leitura do 3° volume. Gostei, há momentos nos quais os relatos são superiores, mas os capítulos "reunião de família" em todos eles me pareceram redundantes... chatos.
Estou encerrando a leitura do 3° volume. Gostei, há momentos nos quais os relatos são superiores, mas os capítulos "reunião de família" em todos eles me pareceram redundantes... chatos.
Vou encerrando o meu “descobrimento maduro” de Érico Veríssimo: hoje
entendo os filmes e as séries de televisão que seus romances inspiraram. Para mim, sua obra é agora uma surpresa muito
positiva. E eu isso confesso mesmo que tardiamente.
Um tributo a “Os Sertões” de Euclides da Cunha
Penso ser uma obra pouco conhecida de Veríssimo o livro “Breve
História da Literatura Brasileira”, no qual foram concentradas suas
conferências em inglês na Universidade da Califórnia, em Berkeley, que
abrangeram os autores pátrios desde a “época colonial até a Geração de 45.”
Um trabalho de fôlego no qual explanou os aspectos mais
significativos dos vários escritores brasileiros nesse longo período,
chamando-me a atenção por uma particularidade ao se referir a “Os Sertões” de
Euclides da Cunha: a sua sinceridade que se dera exatamente comigo ao ler o
“livrão” euclidiano:
“Milhares de pessoas liam “os Sertões”. A maioria dos leitores
ficou fascinada em especial com o estilo do escritor. [E aqui a
sinceridade] Muitos saltavam [e saltam] os dois
primeiros capítulos – “A Terra” e “O Homem” – porque os achavam demasiado
sobrecarregado de termos técnicos, mas detinham-se sofregamente na última parte
da obra – “A Luta” – porque tinha o sabor de um bom romance cheio de intrigas,
pathos (*) e drama.”
(*Pathos, entre outros significados, "paixão”).
Do capítulo “A Terra” li trechos inclusive me impressionando muito
a referência à prática pelos próprios indígenas das terríveis queimadas das
matas para “limpar terreno” ação extremamente danosa para o meio ambiente que é
adotada até hoje.
Embora esteja me referindo a Érico Veríssimo, no que se refere
ainda a “Os Sertões”, a obra de Euclides quando lida com cuidado – mesmo com as
dificuldades do vernáculo difícil do autor – suscitam admiração.
O próprio Mario Vargas Llosa, Prêmio Nobel de Literatura em 2010,
baseado em “Os Sertões” escreveu o romance “A guerra do fim do mundo”, com 790
páginas no qual no prólogo revela:
“Eu não teria escrito este romance sem Euclides da Cunha, cujo livro “O Sertões” me revelou , em 1972, a guerra de Canudos, um personagem trágico e um dos maiores narradores latino-americanos.”
Imagens:
Capa de “O Continente 2”, 24ª edição – Ed. Globo;
Capa
de “Incidente em Antares” – edição do Círculo do Livro de 1975 – Autor da capa:
Natanael Longo de Oliveira.
Um comentário:
Muito bom, Milton! Além da simplicidade da abordagem, há o fato hilário de um vegetariano perdido num churrasco gaúcho... Certamente, seria um prato cheio para o Veríssimo. Forte abraço!
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