19/09/2015

O LIVRO, AS MOSQUINHAS VERDES E O LUAR




Aqui neste canto do escritório, já pelas tantas, livro aberto tento vencer o sono. Já é tarde. Nas páginas abertas mosquinhas minúsculas, verdinhas como revela a lupa, que se na horizontal cabem numa paralela de um milímetro.

De onde elas vêm? Do jardim seria improvável, por causa da distância. Chego perto com o polegar e elas alçam voo não superior a 40 centímetros. Batem nos meus olhos. 

Elas enxergam a ameaça do meu dedo indicador? Elas têm a percepção da ameaça, instinto de preservação?

São por demais minúsculas para tais reações “normais”. Tão pequenas que, antes de fechar o livro eu as espanto, não são muitas, para que não sejam amassadas pelo peso das páginas juntas.

Naquele momento, o universo dessas mosquinhas, essa viagem improvável, é o meu livro aberto.

Os olhos fecham pesados. Já é tarde.

Me estiro, então, numa cama confortável. Mas, não caíra tranquilo no sono ainda leve, tênue. Sou acordado por uma luz agradável, tépida: o luar bate no meu rosto, ultrapassando um vão da janela entreaberta.

Que coisa magnífica! De vez em quando sou agraciado por essa luz que sorrateiramente me invade e me faz bem.

Afinal, qual influência é mais forte? A gravidade da Lua sobre a Terra ou o contrário.

Não resisto, saio lá fora. O céu está límpido, sereno, mesmo as luzes da cidade não impede rever o incompreensível do universo.



São bilhões de estrelas, de sois até maiores que o nosso Sol, planetas outros imensos que, na escala do universo, a Terra cabe, com as equivalências, em duas paralelas de um milímetro.

E onde estou nisso tudo? Uma mosquinha com "voos limitados", cheio de angústias e alegrias, não poucas vezes perguntando o sentido dessa imensidão toda, da própria vida?

Volto para o quarto, o luar já não bate na cama, os astros se movimentam.

Se havia sono, agora a insônia comanda.

Há uma divindade que a tudo isso comanda?

Lá na interioridade admito que nada disso se refere a “geração espontânea”, nem a mosquinha diminuta que frequenta as letras do meu livro.

Impossível desvendar qualquer sentido dessa abóbada, dos conflitos e alegrias que me influenciam no dia a dia. E do que se passa em não mais do que meio metro de gramado.

Não penso em religião, tão contraditórios são seus conceitos.

Mas, repenso esta passagem do Bhagavad Gitâ (“A Sublime canção”), “episódio da grande e antiga epopeia hindu, intitulada Mahâbhârata [Maha – grande; Bhârata – Índia: então, a “grande Índia”], que contem 250.000 versos...”

A passagem:

“O caminho dos que Me reconhecem como o Absoluto e Imanifesto, é muito mais árduo do que o caminho dos que Me adoram como Deus manifesto e possuidor de forma. A concepção de Absoluto, Infinito é a causa mais difícil para a mente finita do homem. É muito difícil para o visível conceber o invisível, o finito conceber o infinito.”

E é nesta concepção que muitas religiões atuam, oram para o “Deus manifesto e possuidor de forma.” Imagens.

Toda essa impossibilidade de conceber o Universo e sua força, se encontra até mesmo na Bíblia, em que desenvolve desafio bem mais corrente, do dia a dia, ao se referir à chuva, neste trecho (36:26-28):

27. Porque faz miúdas as gotas das águas que, por seu valor, derramam a chuva,
29. Porventura pode alguém entender as extensões das nuvens, e os estalos da sua tenda?

Sim, muitos são os cientistas que contam com todo o aparato técnico possível mas não conseguem desvendar tantas e inumeráveis indagações que o Universo impõe. 


                            O tamanho da Terra em relação ao Sol

Talvez não deva me inibir em empregar a palavra correta: mistérios. Insondáveis. A qualquer descoberta, transpõe-se um muro mas em seguida outro mais alto se apresenta. E assim sucessivamente.

Amanhã, seguramente, ao abrir o livro, terei a companhia daquelas mosquinhas verdes frequentando suas páginas, suas palavras. O seu universo...

2 comentários:

Jorge Sader Filho disse...

Bonitos sonhos e divagações, Milton!

Shirley Brunelli disse...

"A criatura, que é tão somente uma partícula microscópica do Universo, não está capacitada para julgar e explicar o Cosmo em todos os seus aspectos".
Ah! benditas mosquinhas e bendita luz da lua, que fizeram você escrever essa crônica deliciosa.
Milton, você ia adorar o livro "O Evangelho à Luz do COSMO" DE RAMATIS.
Beijo!