20/12/2019

FILME “DOIS PAPAS” DE FERNANDO MEIRELLES.


Para quem raramente assiste qualquer filme na TV porque a maioria sem significado baseada em histórias em quadrinhos, DOIS PAPAS (Netflix) é um diferencial muito positivo.

Inspirados em fatos, principalmente nos tempos de Jorge Mario Bergoglio, padre jesuíta nos idos da trágica ditadura argentina período no qual assumiu posição ambígua mas não de adesão, apenas para tentar poupar outros jesuítas da violência e da tortura, foi ascendendo no catolicismo, chegando a cardeal, com uma característica: sempre com modos simples e ligado às comunidades pobres.

Fora dançarino de tango quando jovem, gostava, como gosta, de futebol e. com esse perfil, um crítico da Igreja pelos seus escândalos e pelo distanciamento progressivo dos fiéis da religião dando margem a que milhões deles buscassem outras crenças ainda que explorados materialmente por elas.
Então, o filme retrata a convivência entre o Papa Bento XVI (Joseph Aloisius Ratzinger) antes da sua renúncia e a iminente escolha de seu sucessor, o argentino Bergoglio.
Desenvolve-se, então, um diálogo eventualmente ríspido, mas cheio de respeito, no qual Bento XVI revela seu inconformismo com as posições liberais de Bergoglio que defendia mudanças na Igreja especialmente não tolerar mais os padres e bispos pedófilos que, descoberto o escândalo, eram afastados apenas de suas comunidades, transferidos para outras e nessas, a continuidade dos abusos.
Escolhido Bergoglio o sucessor de Bento XVI, agora Papa Francisco em março de 2013, vem ele alterando o modo de tratar os pedófilos, entregando-os às autoridades públicas num processo necessariamente lento, tais as resistências no interior do Vaticano.
Há um desabafo religioso de Bento XVI que reclama de não mais ouvir a voz de Deus malgrado seus insistentes apelos nas orações. Francisco do mesmo modo e hoje ele até proclama que Deus por Seu filho Jesus, não se houve bem na crucificação.
Posições importantes, essa angústia que afeta todos os religiosos de não serem ouvidos em suas orações e nos seus pedidos,  esperanças não materializadas.
Eu, particularmente, que posso me considerar meio agnóstico, mas não tanto (contemple o céu numa noite estrelado e explique isso tudo), sinto que às vezes se dão tênues sinais que nos afetam para o bem ou para o mal, neste caso como lições. Não dê guarida às tentações! Hoje já se fala mais amiúde da “lei do retorno”, da “causa e efeito”, do “karma”, que cobram ou recompensam o que de mal ou bem praticado ao longo do tempo e da vida.
A GUISA DE MORAL DA HISTÓRIA
O Papa Francisco vem fazendo um trabalho de revisão da Igreja, combatendo, finalmente, a pedofilia em suas hostes e, repete-se, sua vida na Argentina fora simples e conviveu com os mais humildes, se preocupa com eles, combatendo o egoísmo dos abastados ou dos muito abastados que ignoram seus semelhantes que vegetam no mais baixo estágio de pobreza e de necessidades elementares.
Por isso, entre nós, aqueles que querem a Igreja estratificada em suas tradições seculares o criticam e entre nós, aqueles que assumem posicionamento político classificados de extrema direita o chamam de "comunista".
Nos primeiros a visão é turvada pelas tradições mas que, compreendendo tantas mudanças de meios e costumes no mundo, se convencerão a um tempo de que para a Igreja não há outro caminho que não sejam mudanças fundamentais, discutindo, sim, o sacerdócio de mulheres, de homens casados, o celibato e tudo o mais que intrigam e a afetam nos dias de hoje.
Aqueles de posicionamento político radical, chamar Francisco de “comunista” significa absoluta ignorância de suas origens, do que prega e da sua missão na Igreja cuja tarefa é muito difícil.

Muitos são os que sequer sabem o que seja "comunismo".

Essa e outras adjetivações são inaceitáveis num tempo de perplexidade num tempo em que, um líder de uma nação, para mostrar religiosidade recebe ajoelhado “benção” de um suposto bispo que, pelos seus fiéis, construiu um império econômico em poucos anos.

O FILME É IMPERDÍVEL COM DESTAQUE PARA DOIS GRANDES ATORES: Anthony Hopkins como Bento XVI e Jonathan Pryce como Francisco. Diálogos primorosos e direção precisa do brasileiro Fernando Meirelles.

03/12/2019

CRONIQUETAS (I)

A BANANEIRA

Preço de banana. Mas, essa bananeira ai aguentou tudo durante uma construção: agressões, falta d'água e, num dado momento, já livre, sem que se percebesse eclodiu esse cacho que vem sendo acarinhado.












Com os mesmos impactos, ao lado dela floresceu espontâneo um ipê, com jeito de ser de flores amarelas, com vontade de viver que vou cuidando.

Pequenas bençãos que não me passam despercebidas.

A flor das bananeiras é a banana?

Lembro das bananeiras nos meus tempos de São Caetano, no quintal. Os cachos eram tantos que minha mãe fazia bananadas de caldeirão.

Naqueles tempos em que o sol era mais sol e as chuvas mais chuvas.


TIPUANA GRANDE. DE DÉCADAS

Nestes tempos de devastação que me levam às lágrimas de ver tanta ignorância ambiental,  ali na frente, além muro, na rua, uma tipuana muito grande. Uns 15 metros. De vez em quando o forte vento arranca uma ou outra ai pelos bairros.














Hoje ventou muito ela foi sacudida mas está firme. Ela pende um pouco para a rua, mas é uma preocupação sempre pelos estragos quando é arrancada a força pela força das tempestades.

Essas árvores foram plantadas quando da constituição do bairro, há décadas. Elas não seriam as mais apropriadas, mas estão fazendo sombras, liberam a cada ano centenas de sementes que caem girando e depois suas florezinhas amarelas no começo da primavera, que fazem tapetes nas ruas.


FLOREZINHA MATO

Quando do espalhamento das placas de grama, muitas foram as plantas que não poderiam ter lugar no gramado.

Mas, uma se destacou. A florzinhas são azuis, um chapeuzinho com cinco hastes amarelas. Foi mantida. Algumas opiniões de qual "família" pertence a planta...












A MINHA CACHORRINHA PRETA

Já falei sobre esse animal anjo que tive por muitos anos ao meu lado. Ela não foi tratada como merecia e, por isso, sempre me emociono, pelo que eu deixei de fazer por ela.

Ela foi sacrificada porque um veterinário disse que a doença era irreversível.

Naquela manhã, o golpe foi muito forte e um fiquei pelos cantos, em lágrimas de remorso.

Já não pensando tanto, anos depois, inesperadamente ela apareceu nítida no meu sonho, mais gorda, bonita, se aproximou, eu a agarrei e ela apressou-se em se soltar. Como ela sempre fazia, porque sentia que tinha pouco carinho a retribuir.

No sonho, correu ladeira abaixo e entrou nalgum lugar lá embaixo. Creio que ela me informou que está com os bons espíritos que guiam os animais e está bem e, como todo cachorro, perdoou pela que eu não fiz.



Os espíritas dizem que os animais tem alma e por muito tempo ficam por perto daqueles a quem se apegaram, depois de mortos.

Vão para o céu, como admitiu o papa Francisco ao consolar um menino cujo cachorro havia morrido.

Eu acredito nisso.


GANSOS, SIMPLESMENTE GANSOS CURTINDO A VIDA LIVRE

Eu os encontro sempre, e também galinhas de angola quando vou chegando em Águas de São Pedro, nas curvas laterais da cidade meio abandonada.


Eles olham desconfiados e grasnam aos estranhos. Mas, eu paro e espero os movimentos deles.

Um dia desses um veio em minha direção, já contei isso. Só lamento não o ter esperado, para ver o que daria a "conversa".


SÃO CAETANO E "OS SEIOS DE DUÍLIA"

É do início da década de 60 o filme "Viagem aos seios de Duília".

Um solteirão que se aposenta, não encontrou amores pela vida, mas jamais esquecera o seu amor da pré-adolescência, Duilia, que na despedida, porque ele mudaria para o Rio,  lhe mostrou, um pouco, os seios.

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Quarenta anos depois, com aquela imagem preciosa em mente ele vai a procura de Duília numa longa viagem por Minas Gerais até a encontrar num vilarejo remoto.

E aí, ao a encontrar numa casa humilde, ele tem o impacto do tempo que passou também para ela e se afasta decepcionado que bem o havia recebido. Ela tinha se casado e era viúva. Ele comparara a foto da sua juventude ali mesmo na sala,  com os efeitos do tempo.

Passei minha adolescência em São Caetano do Sul e, muitas vezes, mais de 50 anos passados, comparo minha relação com a cidade como algo semelhante aos seios de Duília.









Com uma diferença: os seios da "minha" Duília continuam atraentes e as recaídas são inevitáveis.

Porque há muito, muito a rememorar e... comemorar. (*)


A OPÇÃO POR CERTO ISOLAMENTO

Depois de todas as lutas ao longo das décadas, inclusive às voltas com as incertezas da advocacia, profissão árdua, aos poucos vou me isolando e não achando graça em tantas coisas que me motivavam.

Talvez, "instintivamente" me aproximo da serenidade que é um estágio muito íntimo. Nessas tardes noites da vida.












A Paz não é possível porque estou num mundo à beira do caos e não posso tapar os ouvidos, fechar os olhos.

Aliás, este mundo é um recanto menor no Universo, é o da penitência, do atraso, das diferenças entre os indivíduos uns com elevada vocação moral e outros com baixos instintos. 

Penso que este planeta é até meio esquecido pela Providência.


LIVROS E RESENHAS

Por causa do "isolamento", virei quase desvairado ledor.

Há livros que não consigo ler de tão "desconectado" para mim.

Um deles é o festejado "Macunaíma" de Mario de Andrade escrito em 1928 num período "desvairado", seis anos depois da Semana da Arte Moderna de 1922, em São Paulo.

Não tenho paciência para aquela terminologia indígena. Quem sabe um dia volte ao livro. Por ora tenho outros prioritários.

Dos estrangeiros, estou hoje "preparado" para ler "Assim falava Zaratrusta" de Nietzsche. 

Mas, não sei ainda se algo me acrescentará com sua leitora cheia de rebuscamentos e desvio do que o que foi dito não é bem o que foi dito.

Nietzsche era complicado. Dos que o estudam, estudam até hoje e os resultados nem sempre convincentes.

Neste momento estou folheado do autor alemão, o "Anticristo". Talvez eu o leia. A apresentação do livro informa que Nietzsche desmonta o cristianismo, que seria, para ele, o maior desastre do mundo ocidental pela alienação que produziu (!)

Até este dia resenhei 66 livros no blog respectivo, com o objetivo de não esquecer pelo menos o enredo básico de cada um.












Fique claro que são as "minhas" resenhas, tenho certo orgulho da originalidade.

Porque há muitas por aí.

Essas resenhas são sem "preconceitos" quaisquer que sejam os livros com algumas ressalvas. (**)


ESCRITORES

Tenho certo despeito de escritores que escrevem livros e livros.

Onde buscam inspiração?

Gostei do meu "Joana d'Art", cuja inspiração veio num estalo ocasional mas valeu.

Estou a espera que outros estalos ocasionais eclodam.













OS E OS NÃO CARNÍVOROS

Nestes dias de dezembro muito se fala do preço alto da carne.

Para mim que dela não chego perto, há o asco do odor nos açougues quando TENHO que passar perto tudo isso torna o dito alimento, para mim, impensável.

Talvez tenho me condicionado a tanto.

Já refleti muito sobre a proliferação de animais nascidos para servirem aos matadouros, que proliferam incentivados como negócio ou espontaneamente.

Por que é assim? Por que a grande massa humana não se emociona com o sofrimento deles que tremem na visão iminente da morte violenta?

E por que se sacia num naco de carne sem pensar nisso?

Já tenho falado sobre estas minha reflexões: os 'deuses' da criação promovem  a multiplicação dessas espécies à imolação exatamente para  alimentarem essa imensa massa, a maioria, porque no interior dela ainda há resquícios salientes dos homens das cavernas que caçavam para sobreviver. 

Eram brutos sem saber que eram.

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Não estou aqui para criticar os que pensam diferente. Numa churrascaria não "fiscalizo" o que cada um come. Cada um se alimenta do que gosta, mas eu fico sem a carne.

Como disse, este é o planeta das diferenças.


UM FANTASMA DESMORALIZADO



















Enquanto lia "O Retrato de Doryan Grey", de Oscar Wilde, dei uma lida no conto dele mesmo, "O Fantasma de Canterville".

Esse fantasma assombrava a arrepio dos cabelos os moradores da Canterville Chase a ponto de seu proprietário Lord Canterville resolver pela venda da propriedade ao ministro americano, Sr. Otis, não sem antes o avisar do estranho e indesejado morador assombração.

O fantasma era um antepassado dos Canterville e permanecia na mansão havia séculos como penitência pelo assassinato de sua esposa.

Mas, para demonstrar o lado prático dos americanos, então, o fantasma passou a ser desmoralizado pelo próprio ministro e seu filhos, atitudes que aumentavam o seu sofrimento. Tudo bem humorado.

O fantasma passou a fugir dos novos moradores.

Até que um dia Virginia, filha do sr. Otis, a jovem pura e sem máculas se depara com o fantasma que demonstrara o desejo de... morrer.

"A morte deve ser bela. Repousar deitado sobre a macia terra cor de castanha..."

Então, num ritual não revelado, Virginia ajuda que o fantasma morra e é ele sepultado com as honras daqueles tempo.

O fantasma, antes de morrer, presenteia Virgínia com joias.

É uma história interessante, pelo menos para mim, porque sempre acreditei que o assassino carrega na alma a marca ou o peso de sua vítima. A dívida a ser paga um dia por muitos séculos.


Referências a acessar:

(*) https://martinsmilton.blogspot.com/p/imprensa-memorias-diario-do-grande-abc.html

(**) https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/









Eu j

13/09/2019

A DEVASTAÇÃO DA AMAZÔNIA COMO ESCREVI NO INÍCIO DO SÉCULO

Os textos são longos e tratam do tema muito caro para mim: o ambiental e, principalmente, a preservação da Amazônia.

Nos blogs que ainda detenho, de fácil acesso, são dezenas de artigos nessa linha ecológico-ambiental, mas publicado na imprensa regional dos quais recuperei três deles.

Eu os estou disponibilizando mais para meus registros ficando de livre acesso aos eventuais interessados e curiosos. São eles:

1. Jornal de Piracicaba (Editorial) de 15.10.1997: “Fazedores de Desertos”, partindo de texto sobre a queimada nas florestas, em “Os Sertões” de Euclides da Cunha;

2. Folha do ABC de 06.09.2003: “Um mundo em devastação” no qual aponto aspectos da poluição ambiental no mundo incluindo os absurdos testes nucleares;

3. Folha do ABC de 10.01.2004: “A Amazônia e a devastação” no qual dou destaque a um relatório ministerial que então revelava já no estágio grave de devastação que 25% da área devastada estava abandonada.
Acessar
4. INPE: Artigo mais recente de 30.08.2010, “Queimadas e Devastações”, publicado originalmente na plataforma “Vote Brasil”, extinta, foi transcrito no portal do INPE. Acessar:http://queimadas.cptec.inpe.br/~rqueimadas/material3os/queimadas_e_devastacoes.htm
Reconheço que o desflorestamento não se contém há décadas.
Mas, agora, é o que resta a ser preservado.

 Os artigos são estes:

JORNAL DE PIRACICABA de 15 de outubro  de 1997

FAZEDORES DE DESERTOS                  
                                                                                    
         
                     “Esquecemo-nos, todavia, de um agente
                      geológico notável – o homem.
                      Este, de fato, não raro reage brutalmente
                      sobre a terra e entre nós, nomeadamente
                      assumiu, em todo o decorrer da história,
o papel de um terrível fazedor de desertos.
Começou isto por um desastroso legado
indígena.
Na agricultura primitiva dos silvícolas era
instrumento fundamental – o fogo”

A citação acima, refere-se aos desertos provocados na região do nordeste com as queimadas praticadas de modo devastador que, ao longo do tempo, foi devastando imensas áreas de “flora estupenda”.

Essa citação, não foi extraída de algum manual de  entidade ecológica, entre tantas nacionais e internacionais que criticam a omissão brasileira na questão das queimadas havidas na floresta amazônica. 

Ela é de autoria de ninguém menos que Euclides da Cunha, ao estudar “a terra” em seu livro “Os Sertões”, cuja primeira edição apareceu em 1902.

Esse consagrado autor, já então no início do século, demonstrando certa perplexidade e amargura, apontava o absurdo das queimadas para abrir espaços para a atividade pastoril ou, “ao mesmo tempo o sertanista ganancioso e bravo, em busca do silvícola e do ouro”.

Décadas e décadas se passaram e a prática do fogo continuou destruindo desordenadamente as florestas brasileiras, praticamente extinguindo a mata atlântica e agora, em proporções assustadoras, a própria selva amazônica.

É brutal a omissão oficial a essa calamidade, cuja fumaça cega transeuntes, fecha aeroportos e dificulta a respiração de crianças, exatamente na região antes conhecida como o “pulmão do mundo”, qualificativo que fora um orgulho para nós brasileiros.

À omissão, alia-se o absoluto desrespeito à vida, pela natureza e pelo mistério das matas virgens, com as milhares de vidas que sustentam, levadas de roldão, inapelavelmente, pelo fogo.

Pois esses indivíduos que exploram madeira na Amazônia, não costumam chamar de  “pau” uma árvore com dezenas de anos, exuberante, em vias de ser cortada para ser vendida às serrarias estrangeiras ? Não a transformou em mera mercadoria ? Em vil metal ?

Nos dias de hoje, fala-se muito em ecologia nos discursos, nas solenidades simbólicas de plantio de árvores, nas escolas  mas, na prática, a realidade é dolorosa, assustadora, devastadora.

As autoridades que poderiam reverter esse processo criminoso omitem-se, fecham os olhos ao se depararem com a fumaça das queimadas e se voltam para a política barata, ao supérfluo, às questiúnculas partidárias, à vaidade, à tolice.

Há projetos de implantar o ensino permanente de ecologia nas escolas, de ordem que, no futuro, as crianças de hoje, cuidem da natureza, devotem mais amor por ela. Mas, o futuro já corre sérios riscos. O grave problema se verifica no presente. As ações devem ser tomadas agora, energicamente, de tal maneira que sobre algo para ser cuidado no futuro. Que valha a pena.

 O desrespeito chegou ao insuportável. O despreparo das entidades oficiais em enfrentar tais crimes é desanimador.

Chega a ser patético. As entidades não governamentais (ONGs), por sua vez, apenas denunciam e denunciam, mas não saem a campo em campanhas de protesto e de conscientização. E as queimadas abomináveis continuam.

Há mais de vinte anos, a revista “O Correio da Unesco”, reportava-se  ao “Avanço do Deserto” na Terra, esclarecendo uma das reportagens:

“Muitos acreditam que os desertos do Oriente Médio e da região mediterrânea foram criados pelo homem. Há dois ou três mil anos, as vertentes e as planícies do Líbano, da Síria, o litoral do Egito e da Tunísia eram cobertos por rica vegetação (lembremos os famosos cedros do Líbano)  e forneciam a Roma grandes quantidades de madeira, cereais, azeitonas, vinho e outros produtos. O abate de árvores, a destruição das florestas e da vegetação herbácea e o pisoteio das pastagens, juntamente com a erosão pelo vento e pela água, transformaram esses territórios em semidesertos”.

Incluindo as queimadas que em muito aumenta a gravidade da tragédia, estamos seguindo exatamente essa receita. A de construirmos desertos na região mais exuberante do planeta: a Amazônia.

Esse quadro desolador no “atacado”, se manifesta também no “varejo” em todas as cidades.

Árvores das ruas são cortadas indiscriminadamente, com a tolerância das autoridades, ora porque “fazem sujeira” com as folhas, porque dão sombra, porque danificam o asfalto e ora porque “esteticamente” incomodam o cidadão intolerante e insensato.

E, sem qualquer reflexão, às centenas, as árvores vão sendo cortadas das ruas sem serem substituídas, permanecendo seu toco como um alerta à insensibilidade humana.

É chegada a hora, sim, de olharmos para o futuro e para nossas crianças, de tal ordem que vivam num mundo mais respeitoso com a natureza. Que, ainda que numa mera poesia, se inspirem na simpatia que deve existir entre uma árvore e o homem.

 Entre os animais e os homens e entre estes e a água, um elemento vital, preocupante, também descurado.

No que conta sobre a preservação das águas, são os  discursos com as mesmices de sempre, promessas, decorrendo, ocasionalmente, medidas paliativas e modestas. No caso da fumaça das queimadas, fecham-se os olhos. No caso da água, tapam-se as narinas para não sentir o cheiro putrefato dos rios ou dos peixes mortos pela poluição.

Até quando a omissão? 





FOLHA DO ABC de 06 de setembro de 2003

UM MUNDO EM DEVASTAÇÃO


Não sei bem quando, mas talvez desde que me "conheço por gente" (frase inédita, não?) sou ferrenho defensor da natureza e dos animais — com estes só tive experiências de carinho e amor. Falarei oportunamente sobre essas experiências.

Por ora, direi de um modo amplo na velocidade de um desabafo.

Já não é de hoje que se filosofa em cima duma amarga realidade: a natureza devolve aquilo que recebe, embora pela sua força de recuperação, um milagre, quando deixa de haver a interferência do homem, ela volta a recompor áreas devastadas, dentro de suas possibilidades.

Sem muito destaque, noticia-se vez por outra o grave problema do aquecimento global não só pelo desmatamento mas pelo excesso de poluentes lançados na atmosfera. E as catástrofes que tudo isso provoca.

O maior poluidor do mundo, os Estados Unidos, não se preocupam em introduzir controles efetivos para a poluição industrial agravando seriamente o problema. Se controle houver, será por iniciativa privada, nunca pela ação efetiva do governo americano que considera essa uma preocupação secundária, a ser assumida pelos os "tolos” que desejarem fazê-lo.

Essa soma de desmandos vai fazendo suas vítimas. O calor intenso que surpreende a Europa — embora os especialistas não atribuam aumento da temperatura apenas à poluição, porque fora um fenômeno previsto para 2003 naquele Continente — deve servir como alerta porque a continuar o nível de devastação e poluição produzidas, essas anomalias tendem a ser "normais" daqui para futuro.

Com esse calor intenso, só na França, em razão dele, morreram 12 mil pessoas.

Isso não é pouco.

Entre nós, de muito pouco podemos nos vangloriar. A motosserra trabalha incansavelmente e de modo insano, tanto  na Amazônia e no pouco que resta da mata Atlântica, ora para captar madeira nobre, ora para produzir carvão, ora para aumentar pastos, significando nesse caso, que as áreas devastadas ficam a um passo da desertificação.

Esse efeito também se dá em razão das imensas plantações de grãos, embora seja imperioso preservar áreas verdes nessas plantações de tal ordem a garantir um mínimo de equilíbrio.

E esses assuntos não são levados tão a sério pela mídia.

Cansa, por exemplo, todo "santo" dia, sabermos que o dólar subiu ou desceu um centavo, que o risco Brasil variou para mais ou para menos — um índice que nem mesmo seus idealizadores internacionais dão a importância técnica que se dá por aqui — e se a "nasdaq" flutuou para cima ou para baixo — matérias absolutamente irrelevantes
do ângulo da vida. Enquanto isso, o placar da devastação ou do bom exemplo ecológico constitui-se matéria secundária, normalmente divulgada, no caso da televisão, em horários de pouca afluência.

Na Encíclica 'Centésimo Ano' de 1991 (que comemorou os cem anos da Encíclica `Rerum Novarum'), o papa João Paulo II  posiciona-se sobre a ecologia acentuando que a humanidade com seu consumismo exacerbado vem produzindo a "destruição insensata" do meio ambiente ("Pensa que pode dispor arbitrariamente da terra, submetendo-a sem reservas à sua vontade como se ela não possuísse uma força própria..."). E eu me pergunto, nessa linha de raciocínio, como é possível um mandatário pensar nos dias de hoje em fazer testes atômicos, num planeta já tão sofrido?

Afinal, o que querem esses vândalos, esses matadores rancorosos sem causa e esses devastadores que convertem a natureza numa moeda qualquer, no vil metal? Que num círculo vicioso de intensa interligação multiplicam pelos seus atos, a violência sórdida que vai se banalizando, um alimento indigesto no nosso dia-a-dia?

Para que a vida no seu conjunto tenha valor será preciso mudar a mentalidade universal, iniciando-se um processo de reeducação, de valor ecológico, de preservação, porque mesmo coma alta tecnologia (ou por causa dela), constatam-se dificuldades imensas no planeta a começar pela carência de água potável em países diversos, um problema que tendo a se agravar.

Individualmente, começarmos a dar valor às (supostas)  pequenas coisas, às coisas "simples": a uma fonte d'água, algo sagrado, a uma floresta, a um beija-flor, ao replantio onde possa ser recuperado o que foi devastado, à recuperação de um rio poluído, como um desafio fundamental, necessário...

Na realidade, longe da pieguice, há que haver um esforço na conquista do “amor global”, "ecológico" porque ele é simples e transmite essa simplicidade fundamental.







FOLHA DO ABC de 10 de janeiro de 2004

A AMAZÔNIA E A DEVASTAÇÃO

Preparado por 12 Ministérios um relatório, abordando a devastação da selva Amazônica, revelou o óbvio que pode ser resumido em poucas palavras: o desmatamento é acelerado e celerado. Antes de trazer os números da devastação divulgados nesse relatório, preciso dizer que não acredito numa ação firme desse governo para conter com a autoridade necessária esse quadro de abuso que, na verdade, diga-se desde logo, repete a mesma postura de todas as administrações anteriores.

Vejo na ministra Marina Silva um sem número de qualificativos: sua origem humilde, seu esforço pessoal para superar dificuldades, sua identificação com a mata e sua ligação com os ideais do preservacionista Chico Mendes.

Mas, daí a impor o nível de autoridade necessária para dar um basta nessa insanidade que se pratica na Amazônia, há uma longa distância.

E. por isso, sou pessimista no que concerne à sua estada na pasta do Meio Ambiente.

Ademais, o mundo se move por valores econômicos. Sabe-se diariamente como se comportaram as bolsas de valores do mundo inteiro. E nesse contexto, o dos "valores econômicos”, nele se inclui a lavoura e a pecuária, a madeira, ainda que, para a expansão devas atividades, pague-se um preço humano elevado, qual seja, do desmatamento desenfreado, sem medir as consequências para as futuras gerações.

Há pouco. num artigo simples mais altamente revelador publicado no jornal "O Estado" (título: "Indignação e fatalismo na Amazônia"), o cientista José Goldemberg. a propósito do nível de devastação que se constata na Amazônia, parece concluir nas entrelinhas que tal estado de gravidade não causa a indignação que seria esperada.

São suas palavras:

"Há no Brasil muitos acontecimentos que provocam - ou deveriam provocar - nossa indignação, mas não há nada na escala do que está acontecendo na Amazônia, a última das grandes florestas tropicais remanescentes".

Realmente, a questão ecológica não se constitui, efetivamente, numa grande preocupação nacional, há muito mais "dar de ombros" oficial do que indignação salvo no meio de grupos privados esclarecidos que alertam para as consequências permanecendo o desrespeito à flora e à fauna, como o que vem sendo praticado na Amazônia.

É "compreensível" essa omissão.

Afinal, as gerações futuras que resolvam o problema! Ora, os efeitos não são imediatos, mesmo que já sejam graves e urgentes...

Eis alguns números do relatório (fonte: jornal "O Estado" de 31.12.03):

. Área total estimada de devastação na Amazônia: 631 mil km2 ou 15,7% de toda a floresta;

. Área devastada entre agosto/01 a agosto/02: 25.500 km2, significando aumento de 40% em relação aos meses anteriores. Tal extensão é maior do que o estado de Sergipe;

. Estão abandonados cerca de 25% da área total desmaiada (165 mil km2) c isso não é pouco, correspondendo a uma área maior que o estado do Ceara;

. A pecuária é responsável por cerca de 80% de toda a área desmatada: o plantio da soja cresceu 57% entre 1999 e 2001 significando efetiva participação no desmatamento desordenado e sem controle oficial. E há, ainda, a ação implacável das madeireiras, muitas na ilegalidade que sobrevivem apenas pela falta de fiscalização.

Não deixa de acentuar José Goldemberg, que na extensão maior da Amazônia o solo é arenoso. E, nessa realidade. "o solo é paupérrimo, a floresta é mantida graças ao equilíbrio do ecossistema". Sendo assim, torna-se improdutivo em pouco tempo, o que explica o abandono da imensa área devastada (165 mil km2).

Há, pois, um imenso desafio se a matéria for tratada com o cuidado c premência que ela exige e que consiste no manejo sustentado, respeitoso com a mata e a fauna que ela contém.

Mas. como acima dito. sou pessimista quanto a qualquer medida enérgica do governo nessa linha, até mesmo pelo retrospecto conhecido, de omissão.

Vejam, como este país continental, mas pobre, tem seus exageros, seus atos megalômanos e antiecológicos: o Brasil está comemorando a impressão do maior diário oficial do mundo. Com efeito, a edição do dia 19 de dezembro último, o jornal oficial federal circulou com 5.700 páginas, devendo assumir posição de destaque no livro dos recordes (-Guinness Book").

A explicação: a Constituição exige a publicidade de todos os atos oficiais...

Perguntar não ofende: quantas árvores foram derrubadas para produzir apenas um exemplar desse diário oficial, verdadeira aberração? E uma centena? E os milhares de exemplares da edição toda?

Paro por aqui, indignado, diga-se.