11/06/2023

FLORES E ORAÇÕES

Mirando meu pequeno quintal, misturo, na preguiça que se me abate, uma série de pensamentos que vão e vem, incluindo pessoas, fatos e emoções que se perderam no tempo e que, num desses instantes, voltam à mente de modo inexplicável.

Estava exatamente refletindo sobre isso, sobre o passar dos anos – e como passaram céleres! – volto-me para o alto e lá as nuvens brancas sopradas pelo vento, formavam figuras disformes que se alteravam rapidamente pelo invisível que sopra. Sempre me encantam esses movimentos.

Mas, ali, do lado da pequena garagem, naquele momento de serenidade, sou alertado pela transcendência de fenômenos tão corriqueiros ou complexos: quais as indagações que esses movimentos somados a tantos outros nos influenciam de algum modo e o próprio planeta? Mas, que são ignorados com um simples dar de ombros? Qual a conjunção universal dessa sucessão de fenômenos? Para que nisso pensar se difíceis?

Quanto a mim reclamo e reclamo da ignorância que não me deixa avançar! Simples pardais por cima me desafiam como se rissem das minhas impossibilidades. As maritacas barulhentas no cume das árvores...

Talvez, de um outro modo já tenha falado dessas “angústias” todas. Se falei, que me perdoem.

Digo que tenho inspirações neste meu pedaço de chão. Neste meu pequeno quintal fico ao lado ou junto de minhas plantas, quase um mundinho a parte.











Tenho aqui uma muda de “ora-pro-nobis” que quando plantei não tinha de tamanho mais que um palmo. Agora ela avança firme sobre o muro com aqueles espinhos agressivos e imperdoáveis.

Nele acompanho as poucas laranjas que amadurecerem num único pé, aguardo as três primeiras “ponkans” que também amadurecem, minhas roseiras, os hibiscos brilhantes, inclusive um, cujas flores chamo de “espeloteadas” porque dobradas, mas lá estão as anteninhas rodeadas de pontinhos amarelinhos. Alguém me explique essas perfeições todas.



Penso nas bananeiras como uma planta abençoada porque num dado estágio de crescimento, à noite, no silêncio do milagre, elas vertem o coração de onde florescem os cachos pesados. Essas bananeiras aqui se entrelaçam com um ipê que nasceu “espontaneamente”.

Um poema que escrevi há décadas chamava as florestas de “templos violados” pela ação predatória perversa do homem que já então demonstrava não entender nada da harmonia que o planeta contem como garantidor da vida.

Uma estrofe:

Um Templo sob azul e límpida nascente

Permitia saciar n'Alma adormecida,

Inspiração profunda no mundo perecida

Intuindo orações de elevação crescente.

Se a mata fechada é um templo para mim, neste meu pedaço de terreno tão infértil, tão forrado de pedras, plantas tão bonitas, porém, considero uma ...capelinha. Que me faz bem demais.

Ora, direis, falar com as plantas é um delírio, tal a impossibilidade de recepção do que se lhe é dito. Não há que esquecer que o pensamento é uma força.

E, ademais, o iogue Yogananda relata que visitava frequentemente o americano Luther Burbank, "um santo entre as rosas" a quem qualificava de horticultor, um cientista que fazia experiências positivas com plantas e até conversava com elas: "Além do conhecimento científico, o segredo para melhorar o cultivo das plantas é o amor". (*)

E, então nestes tempos de devastação ambiental é sempre bom lembrar que, no simbolismo do Gênesis, o "verde" foi criado antes dos animais e do homem. Prioridades do Criador.

Em muitas madrugadas sob o olhar da lua, ouvindo a voz do silêncio, tento estreitar essas afinidades com o que transmitem esse ambiente à minha frente.

Eu sei da paz no humilde brilho das plantas e de suas flores estas sempre presentes em atos importantes da vida colhidas para prestigiar a vida e a solenidade da morte.

E a oração nesse clima todo, nessa luta em controlar o pensamento de regra avassalador, sempre tenho em mente, em alguns momentos, com tais inspirações, seguir o versículo 6.6 do Evangelho de Mateus. É um incentivo ao encontro e à meditação. Ao silêncio.

Eu tento isso tudo. Porque, repito, o pensamento corre solto e quanto me torno indiferente a essas transcendências! Contradições.

Não convém me alongar, mas preciso falar dos passarinhos. Mesmo cuidados, por aqui eles são poucos, mas sei que o dormitório de muitos deles é uma ameixeira de tamanho avançado que faz parte do conjunto. Bom que se diga que nos seus galhos baixos florescem orquídeas.


Mas, se tudo favorável, voltarei ao tema.


Referência:


(*) Livro “AUTOBIOGRAFIA DE UM IOGUE” de Paramahansa Yogananda. Essa mesma experiência com o cientista citado na transcrição, com mais detalhes é revelada no livro “A vida secreta das plantas”.

● Esta crônica é transcrição da publicação "O Ginasiano" de junho de 2023 que faz parte, entre outras iniciativas, do grupo de veteranos do Ginásio Amaral Wagner de Utinga - Santo André.

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