25/08/2023

TREMORES

Esta crônica é pouco ortodoxa pelas revelações que faço. É um esboço ou um incentivo do que poderá se constituir em exposição mais ampla, no qual esta crônica, melhor desenvolvida, seria uma página ou um capítulo.

Há muito que dizer... o tempo dá um tempo.

Eu já relatei que um dia fiz a primeira comunhão e minha mãe fez uma festinha comemorativa na casinha modesta onde morávamos no bairro Fundação (SCS) mesma sala onde brincava de escritório. Havia base redonda duma mesa de centro que ficava pouco acima dos pés na qual “arquivava” papeis do “meu” escritório.

Minha mãe fez questão dessa comemoração.

Aqueles foram tempos felizes, mas tudo tem o seu tempo.

Houve esse sentido religioso do qual me afastei.

Já avançando na adolescência vivi com meus irmãos mudanças inesperadas.

Não me animo agora a falar sobre isso se realmente acreditar no que aqui vou relatar.

Talvez um dia me anime a tanto numa explanação mais elaborada tentando resolver sob a minha ótica essas experiências de vida como essas que, penso, superei.

Minha irmã mais velha sempre demonstrara, digamos, “sensibilidade espiritual” e na busca de respostas às projeções interiores que não entendia enveredou pelo ocultismo, esoterismo e inclusive no Rosacrucianismo da AMORC, naqueles tempos muito na moda.

Não há dúvidas que essa sua busca influenciou meu irmão e também a mim.

Esses irmãos já faleceram.

O ocultismo concentra uma gama de caminhos e alguns são até perigosos quando se insiste em os trilhar sem os entender.

Mas, hoje, me parece, com tantas alternativas de conhecimento esse tipo de trilha é pouco enveredada, acho.

Havia uma máxima que dizia que aquele que enveredasse pelo ocultismo, sempre teria algum lampejo em sua mente, fragmentos desses caminhos pouco ou muito trilhados. Quanto a mim há muito não me preocupo porque desde sempre me julguei um pré-neófito.

Nem sempre a religiosidade, nesses estudos, era invocada.

No caso da AMORC não me lembro da menção, por exemplo, a Jesus e o que representava nesse “mundo alternativo”, até que li um livro, “A vida mística de Jesus” escrito por um dos principais líderes da Ordem no passado (H. Spencer Lewis).

Um livro ou uma corrente filosófica, posso qualificar desse modo, que muito me influenciou, foi “Conceito Rosacruz do Cosmos” ou “Cristianismo Místico” de Max Heidel.

No grosso volume de mais de 500 páginas entre muitos temas, sobre a presença de Jesus no mundo, escreveu ele:

“Se Cristo Jesus tivesse morrido simplesmente, ter-Lhe-ia sido impossível executar sua obra. Mas, os cristãos têm um Salvador ressuscitado. Alguém que está sempre presente para ajudar os que invoquem o Seu nome. Tendo sofrido de tudo como nós, e conhecendo plenamente as nossas necessidades, Ele é o lenitivo para os nossos erros e fracassos enquanto continuarmos tentando viver uma vida digna. Devemos ter sempre ante os nossos olhos que o único verdadeiro fracasso é deixar de tentar.”

Então, os pecados do tempo de Jesus e os de agora, agravados, estão por toda parte: guerras, assassinatos, desonestidades, perseguições…

Mas, a todos que queiram se voltar à “vida digna”, ele está presente. É um amigo que pode ajudar no invisível as angústias, o desespero e até o ter sempre por perto.

Quero dizer que desde há muito, nas minhas reflexões questiono passagens de Jesus no seu tempo. Não se trata de arrogância inconsequente. Mas, atribuí a mim o direito de refletir sobre alguns aspectos de sua vida e tudo aquilo que não me é dado entender.

Por isso que — e já me referi a esse versículo — aplico Mateus 6.6 (“se quiser falar com Deus”). Mas, cada vez mais estou me impondo buscar a sua amizade e proteção.

Não estou aqui fazendo pregação religiosa — nem pensar! — e vou relatar linhas a seguir experiência fora desses conceitos.

Mas, antes, é sempre bom lembrar que essas correntes esotéricas e mesmo o espiritismo doutrinam que a vida é regida pela “lei das consequências”, para o bem e para o mal. Pelos atos praticados. E essa lei age a seu tempo e hora até em reencarnações futuras.

E uma dúvida que tenho: o livre arbítrio, ainda que limitado, rege o destino duma vida? Como conciliar certos acontecimentos da vida que nada teriam a ver com nossas escolhas individuais?

Esses mistérios que me rodeiam.

                                                    ▬ / ● / ▬

Eu disse que o ocultismo pode ser perigoso e pode provocar experiências estranhas.

Ele pode mexer com o psiquismo. Conheci casos graves sobre essa influência naqueles idos.

No livro Zanoni de Edward Bulwer-Lytton, cujo enredo seria de “ocultismo fantástico” segundo indevidamente qualifica a capa, o personagem que dá nome ao livro e outro personagem, Mejnour, tinham a dom da imortalidade, viviam havia séculos. Eles agiam numa linha ambígua entre os mortais embora a obra fale no aperfeiçoamento da alma interior para que os homens se tornem mais que homens (todos os seres humano).









Mas, um terceiro personagem por tentar desvendar os poderes de Mejnour atraiu espíritos horrendos que o perseguiam.

Quis ou não o Autor, a verdade é que ele estabeleceu a tênue linha entre a iniciação para o bem ou para a tragédia da possessão neste caso ao não merecedor daqueles conhecimentos herméticos.

Relatei isso no meu “Joana d’Art” (*). Se bem me lembro, quando lia os trechos mais assustadores do livro (eu li mais de uma vez), as luzes se apagaram na minha sala.

Um susto e na penumbra.

Uma outra vez — talvez não fosse o mesmo livro, mas outro com as mesmas incursões — estava sozinho numa chácara em Campo Limpo Paulista, num local isolado, tarde da noite, escuridão total. Essa segunda experiência me levou ao descontrole e à busca de alguma luz… de vela…


















Claro que muitos rirão, dirão que se tratara de mera coincidência — “muita” para o meu modo de pensar, porém.

No “Conceito Rosacruz do Cosmos” a possessão é admitida lendo-se uma história na qual seria comprovada a reencarnação.

E os Evangelhos, quanto Jesus expulsou esses espíritos do mal, dominadores!

Não encerrei ainda esse tema. Há os Terrores.


Referência:

(*) 




26/06/2023

ETÉREOS

O passado está comigo...”

Espero que estes escritos não revelem delírios porque volto no tempo e me situo nas margens do rio Tamanduateí. Pela ponte de madeira sobre ele, a poucos passos de São Caetano, chegava do lado da Vila Califórnia (SP) avançando naqueles campos devastados e mais lá à frente campinhos de futebol.

Aquilo tudo tinha sabor de aventuras, até nos detalhes: a alegria em encontrar um pé de manga recém-brotado do caroço, em folhas grenás, os túneis das paquinhas nas areias à borda das valetas e, arranhando pelos seus espinhos, os juás brabos que o grito unânime denunciava como venenosos seus frutos verdes- amarelinhos que maduros expelem suas sementes.

Hoje já nem sei do veneno. Já há informações que seus frutos devidamente manipulados têm propriedades medicinais. De admirar! E nem penso que proliferassem em terrenos distantes de seu ambiente “normal”. Porque aqui perto me deparo, nascida num canto de uma guia, uma muda da planta que vai indo muito bem.











Juá "renascido"


Qual a origem de sua semente a ponto de espocar nesse local?

Mas, nesses campos com essa vegetação arbustiva, com os juás em profusão, sempre era surpreendido pelas borboletas azuis. Se bem me lembro, grandes que iam se aproximando brilhando sob o sol. Esvoaçavam ali e aqui e saiam em busca das raras flores para cumprir sua missão de polinizar as que encontravam.

Eu não posso esquecer, porém, que encostadas nos muros daquelas casas humildes em ruas de terra batida proliferavam dálias enormes e as flores amarelinhas das giestas. Não tenho mais visto essas belezas. A última giesta encontrei um dia em Campos do Jordão. Consegui as sementes, elas brotaram mas não vingaram. Talvez prefiram locais mais frios porque agora tudo mudou...

As borboletas azuis nunca saíram dos meus encantos a partir da infância.

E parece que não somente comigo esse encanto com elas.

Há pouco relembrei ao acaso o belo poema, “Meus oito anos” de Casimiro de Abreu que no trecho duma estrofe, diz:

(…)

Correndo pelas campinas

A roda das cachoeiras,

Atrás das asas ligeiras

Das borboletas azuis!

Aqui no meu pequeno quintal esvoaçam borboletinhas brancas e amarelas, bem-vindas mas que não têm o encanto daquelas azuis de tamanho exuberante.

No dia do sepultamento do meu generoso irmão, há alguns meses, no magnífico Cemitério Horto da Paz, em Itapecerica da Serra, no qual a ecologia é ponto de referência ali, não tendo ido ao ato final da entrega do seu corpo ao túmulo, acompanhando enquanto isso o suave nadar das carpas beirando canteiros — lá não há moedas atiradas na água que poderiam colocá-las irresponsavelmente em risco — meditava como muito tenho feito, sobre esses mistérios todos da vida e do Universo não escondendo, intimamente, minhas angústias … e, então, no meio das flores eis que brilhou ao sol bem na minha frente, por um instante… uma borboleta azul!






"Horto da Paz" - Ecológico



Não do tamanho que admirava na minha infância mas foi muito significativo esse, digamos, reencontro naqueles momentos de luto.

Porque há alguns anos refletindo um pouco sobre essas transcendências escrevi uma composição inspirada nelas, que chamei de “etéreos” na qual a borboleta azul na sua dança suave não desprezara o resto de vida que havia numa margarida cujas pétalas já haviam caído.

O poema – se me permitido assim qualificar – é este:

ETÉREOS

Nessa de desânimo

apatia

Não sei o porquê

de tal melancolia

(ou nostalgia?)

Desmedida


Sei não!

Cadê a Inspiração

os elementos Etéreos?

Clamo, pois, só, no (meu) deserto

Respostas não vêm

Ilusões não há (mais)

Miro margaridas murchas

(bem-me-quer, bem-me-quer!)

Que se preparam para semente

Sinto o sol...

mas não me aqueço.

Num momento, surpreso

confuso,

Sinto o Etéreo, porém.


Uma manchinha azul

No éter

Vindo, chegando, esvoaçando!


Ora, uma simples...

Borboleta ...azul!


Ela dança nos meus olhos

Solene, encantada, frágil

magnífica, rebrilhante...

E pousa, então...

na margarida

a mais desfeita

na gema amarela.

(apenas três pétalas ressequidas)


Apreendi logo

o valor da escolha...

Da borboleta azul

Etérea

tão tênue

tão efêmera

Bem-vinda...


Porque na margarida

murcha

na gema

Ela sentiu a vida

(ainda)


Assim falava ela

a borboleta azul

Etérea

na minha nostalgia

(ou melancolia?)

Naquele dia…








11/06/2023

FLORES E ORAÇÕES

Mirando meu pequeno quintal, misturo, na preguiça que se me abate, uma série de pensamentos que vão e vem, incluindo pessoas, fatos e emoções que se perderam no tempo e que, num desses instantes, voltam à mente de modo inexplicável.

Estava exatamente refletindo sobre isso, sobre o passar dos anos – e como passaram céleres! – volto-me para o alto e lá as nuvens brancas sopradas pelo vento, formavam figuras disformes que se alteravam rapidamente pelo invisível que sopra. Sempre me encantam esses movimentos.

Mas, ali, do lado da pequena garagem, naquele momento de serenidade, sou alertado pela transcendência de fenômenos tão corriqueiros ou complexos: quais as indagações que esses movimentos somados a tantos outros nos influenciam de algum modo e o próprio planeta? Mas, que são ignorados com um simples dar de ombros? Qual a conjunção universal dessa sucessão de fenômenos? Para que nisso pensar se difíceis?

Quanto a mim reclamo e reclamo da ignorância que não me deixa avançar! Simples pardais por cima me desafiam como se rissem das minhas impossibilidades. As maritacas barulhentas no cume das árvores...

Talvez, de um outro modo já tenha falado dessas “angústias” todas. Se falei, que me perdoem.

Digo que tenho inspirações neste meu pedaço de chão. Neste meu pequeno quintal fico ao lado ou junto de minhas plantas, quase um mundinho a parte.











Tenho aqui uma muda de “ora-pro-nobis” que quando plantei não tinha de tamanho mais que um palmo. Agora ela avança firme sobre o muro com aqueles espinhos agressivos e imperdoáveis.

Nele acompanho as poucas laranjas que amadurecerem num único pé, aguardo as três primeiras “ponkans” que também amadurecem, minhas roseiras, os hibiscos brilhantes, inclusive um, cujas flores chamo de “espeloteadas” porque dobradas, mas lá estão as anteninhas rodeadas de pontinhos amarelinhos. Alguém me explique essas perfeições todas.



Penso nas bananeiras como uma planta abençoada porque num dado estágio de crescimento, à noite, no silêncio do milagre, elas vertem o coração de onde florescem os cachos pesados. Essas bananeiras aqui se entrelaçam com um ipê que nasceu “espontaneamente”.

Um poema que escrevi há décadas chamava as florestas de “templos violados” pela ação predatória perversa do homem que já então demonstrava não entender nada da harmonia que o planeta contem como garantidor da vida.

Uma estrofe:

Um Templo sob azul e límpida nascente

Permitia saciar n'Alma adormecida,

Inspiração profunda no mundo perecida

Intuindo orações de elevação crescente.

Se a mata fechada é um templo para mim, neste meu pedaço de terreno tão infértil, tão forrado de pedras, plantas tão bonitas, porém, considero uma ...capelinha. Que me faz bem demais.

Ora, direis, falar com as plantas é um delírio, tal a impossibilidade de recepção do que se lhe é dito. Não há que esquecer que o pensamento é uma força.

E, ademais, o iogue Yogananda relata que visitava frequentemente o americano Luther Burbank, "um santo entre as rosas" a quem qualificava de horticultor, um cientista que fazia experiências positivas com plantas e até conversava com elas: "Além do conhecimento científico, o segredo para melhorar o cultivo das plantas é o amor". (*)

E, então nestes tempos de devastação ambiental é sempre bom lembrar que, no simbolismo do Gênesis, o "verde" foi criado antes dos animais e do homem. Prioridades do Criador.

Em muitas madrugadas sob o olhar da lua, ouvindo a voz do silêncio, tento estreitar essas afinidades com o que transmitem esse ambiente à minha frente.

Eu sei da paz no humilde brilho das plantas e de suas flores estas sempre presentes em atos importantes da vida colhidas para prestigiar a vida e a solenidade da morte.

E a oração nesse clima todo, nessa luta em controlar o pensamento de regra avassalador, sempre tenho em mente, em alguns momentos, com tais inspirações, seguir o versículo 6.6 do Evangelho de Mateus. É um incentivo ao encontro e à meditação. Ao silêncio.

Eu tento isso tudo. Porque, repito, o pensamento corre solto e quanto me torno indiferente a essas transcendências! Contradições.

Não convém me alongar, mas preciso falar dos passarinhos. Mesmo cuidados, por aqui eles são poucos, mas sei que o dormitório de muitos deles é uma ameixeira de tamanho avançado que faz parte do conjunto. Bom que se diga que nos seus galhos baixos florescem orquídeas.


Mas, se tudo favorável, voltarei ao tema.


Referência:


(*) Livro “AUTOBIOGRAFIA DE UM IOGUE” de Paramahansa Yogananda. Essa mesma experiência com o cientista citado na transcrição, com mais detalhes é revelada no livro “A vida secreta das plantas”.

● Esta crônica é transcrição da publicação "O Ginasiano" de junho de 2023 que faz parte, entre outras iniciativas, do grupo de veteranos do Ginásio Amaral Wagner de Utinga - Santo André.

05/04/2023

AONDE VAMOS? O QUE ESPERAR?

 Mas só sei ler livro impresso!






Este breve texto tem algo a ver com esse quadrinho do Recruta Zero.

O personagem que segura o livro, é Platão, o "intelectual" do quartel, que parece resistir à modernidade — ler um livro no "tablet" —, dizendo que o livro impresso "é um experiência mais completa", é um romance, um volume  "perfumado".

Não, o perfume do livro, isto é, o cheiro da tinta e do papel só se sente nos volumes novos e essa "virtude" — a do perfume — se revela tenuemente. Mas, se revela. Em dois livros novos aqui comigo: "Stalin" e "Leonardo da Vinci" esse leve perfume de tinta e papel, agradável, não foi preconceituoso nem com o primeiro, a biografia de um ditador perverso.

O quadrinho questiona a modernidade, ainda do tablet.

Quanto a mim, nem pensar em ler livros no computador ou afim. Os poucos que li nesses recursos, tiraram a minha liberdade de anotar, de refletir nas próprias linhas do livro.

Não creio que me adapte a esses recursos, a esse modo de ler livros.

O livro para mim tem que estar à mão e não numa tela.

Depois de tudo a que me vi obrigado a aprender e me adaptar, aos sistemas digitais e tudo o mais há recursos que rejeito.

Por exemplo, eu tenho celular e costumo dizer que eu o uso, assim, mas ele "não me usa".

Eu fico perplexo com a ostentação desse aparelho mesmo com pessoas em caminhada dominical, meio curvados olhando para a telinha.

Vou confessar uma coisa: eu ando angustiado com a velocidade como as experiências se efetivam: como estaremos com o advento da Inteligência Artificial daqui a pouco? Esses sistemas integrados que respondem a tudo? E essas experiências são só o começo. Acredito que logo seremos questionados por eles, por esses sistemas todos, aí incluída a AI.

Estou preocupado e mesmo angustiado. Enquanto estiver por aqui, de quais prazeres terei que abrir mão com toda essa tecnologia que avança de modo cada vez mais rápido? Que nos desafia? A própria vida será alterada?

Amenizo minhas angústias com o livro que acabo de abrir, sem perfume porque é bem possível que ele tenha frequentado algum sebo.

Mas, para mim o livro impresso não precisa de perfume. 

Não exagero, o perfume está nas expectativas que o livro vai desvendando, página por página.







Obs.: esse quadrinho foi publicado na edição de "O Estado de São Paulo" de 03.04.2023.


15/03/2023

MAS, NÃO ESTÁ BOM ASSIM?

 (Tem momentos em que Deus responde)

Neste meu estágio de vida, com alguma frequência, noite adentro, tento encontrar alguma inspiração aos segredos do Universo que são tantos, insondáveis e nessa linha, quantas vezes me pergunto, aquelas perguntas até desprezadas, porque respostas não vêm, “o que faço por aqui?”, “qual o sentido disso tudo?”

Porque são muitos os segredos mantidos em ...segredo além da compreensão.

Qualquer que seja o gênio humano que pensa ter desvendado um desses segredos num momento dado, se depara com um outro muro a ser escalado e outro e outro formando uma barreira interminável de obstáculos aprofundando os desafios e submetendo a inteligência.

Seria esta uma razão para os mistérios do Universo? E não sou muito de leitura evangélica, mas leio ("Aos Corintios", 2-14):

"Ora o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem  loucura, e não  pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente". 

 Qual filósofo ou espiritualistas devotos de qualquer fé, desvendaram esses mistérios?

Por outra, não sou eu quem poderia interpretar sonhos mas eles estão presentes na vida. Com qual mecanismo psíquico eles se manifestam? Nesse meu mundo de ignorância total, quantos deles me são tão agradáveis? Pois convivo neles não sei em que plano com pessoas atenciosas, gentis que parecem ouvir o que falo mas não respondem.

E também sonhos um pouco mais reveladores, como este:

Viajo na noite de breu. Não sei bem como cheguei até ali e onde estou. Noite de breu. Acho que estou onde tenho minhas raízes. Nada enxergo, mas pergunto para alguém que não vejo. Aqui é a rua ...? A resposta não veio sonora, mas fui informado por algum modo que era. Mas, a rua era muito acidentada não poderia ser. Nem nos meus tempos de menino que guiava barquinhos de papel pelas guias quando era ainda de terra.

Os barrancos são altos, dava para perceber naquelas trevas. Paro na frente de uma velha casa mal conservada:

- Aqui mora minha tia M.?

Não obtive resposta, mas entrei. Algumas crianças crescidinhas sentaram perto de mim e alguns moços que também lá estavam  me olhavam com condescendência.

Um deles de óculos:

- Nós fizemos alguns negócios, você se lembra?

Não, não me lembrava.

Minha tia aparece vestida com um vestido longo, simples, levemente rosado.

Se aproxima, me beija o rosto e desaparece.

Acordei.

Há muitos anos que minha tia falecera.

Essas sensações além de me deixarem perplexo, me reconfortam.

Tento pensar na casa velha. Não importa, nela moravam seres cordiais e amáveis.

A simplicidade, para que mais?

Há sonhos que me aterrorizam - não falarei deles pelo menos agora. Por isso, ao me recolher, não poucas vezes peço às Divindades que me façam, nas minhas “viagens” etéreas, estar perto de espíritos com um grau superior ao meu.

Não faz muito conversava num ambiente público com um amigo, um sujeito bom, mas que tem por hábito usar muito o baixo calão por qualquer razão. Eu já havia chamado sua atenção sobre isso. Às vezes me parece que o baixo calão é um vício meio parecido com o cigarro: vicia. Ambos fazem “cortes” nas inspirações creio, na sutil revelação que numa intuição qualquer nos é dada.

Então, dele não se poderia esperar, pensava, algum pensamento revelador que se aproveitasse, que saísse daquele círculo mundano. Mas, num momento de divagação sobre tudo o que nos rodeia ele, apontando para o sol lá fora afirma:

—  Bom, alguém fez tudo isso.

E na linha desse meu amigo que reafirmo os segredos imensos da vida de cada um, eu fico perplexo em constatar que neste planeta, convivem bem ou mal seres humanos com alto grau de entendimento ao lado de outros que agem como feras. Vizinhos, um perverso e um caridoso.

E é desses, mas não só, que se assistem barbaridades inenarráveis e a vida segue aos que, mesmo magoados profundamente, têm que sobreviver já no dia seguinte.

E as grandes tragédias que vitimam centenas e até milhares de vidas num só golpe?

E essas tragédias, seria a aplicação da “lei da causa e efeito” aceita pelos espiritualistas, agora mais popularizada como “lei do retorno”? Essa “lei” tem efeito individual e coletivo?

Sim, a vida é frágil, mas preciosa para cada um de nós mesmo que não compreendida.

Bento XVI, em 2006, alemão, ao rezar no antigo campo de concentração nazista de Auschwitz na Polônia, aos horrores e mortes impostos a milhares de judeus, àquelas vibrações tenebrosas do local, perguntou:

- Onde estava Deus?

Essa é uma pergunta que cala na mente de todos nós ao assistirmos tragédias que emocionam.

Mas, foi Bento XVI, em suas últimas palavras antes do falecimento, quem disse:

- Deus, eu te amo.

Qual fora a motivação do papa emérito a tal confissão? Naquele momento da morte tivera a ampará-lo uma mão divina, uma visão iluminada?

Nunca se saberá porque a experiência fora pessoal e intransmissível.

Nessas noites de Lua cheia ou sem Lua, estrelas incontáveis, perto de minhas plantas – uma árvore é o repouso de passarinhos – que tomo a liberdade de perguntar a Deus:

- Por que tantos segredos? Mistérios? O que fazemos aqui nessa imensidão, num lugar proporcionalmente tão pequeno considerando o Universo ilimitado?

Até que me detive na Epístola do Apóstolo Paulo aos Romanos. Versículo 12: 2, 3:

2. E não sede conformados com este mundo, mas sede transformados pela renovação do vosso entendimento, para que experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus.

3. Porque pela graça que me é dada, digo a cada um dentre vós que não pense de si mesmo além do que convém; antes, pense com moderação, conforme a medida da fé que Deus repartiu a cada um.

Então, Paulo recomenda nos conformar com este mundo e, então, “não pense de si mesmo além do que convém”. Porque há nesses segredos indevassáveis, vou completando, “a medida da fé que Deus repartiu a cada um”.

Tenho um amigo com um nível melhor de compreensão, iraniano que vive há décadas no Brasil, seguidor da Fé Bahá’i, ocasionalmente eu o provoco sobre essas indagações que ele aceita bem, Deus, o Universo, os mistérios, essas angústias todas até que um dia desses ele me remeteu esta frase de Bahá'u'lláh, fundador de sua religião (*):

"E tu te consideras um ser insignificante, quando universo em ti se encerra?"

Mas, o que realmente pondero é a minha ignorância total “quando o universo em mim se encerra”. E, rigorosamente, com todos esses desafios, afinal, me pergunto: “sou insignificante”?

Bom, há momentos em que a vida enleva aqueles momentos que propiciam significâncias. E, penso muito nisso, ao final dos meus dias, levarei minhas experiências que só podem ser relatadas, jamais vividas por quem as tenha ouvido porque a emoção do momento não se transfere.

E, com o esquecimento ao qual estou reservado um dia, irei para algum estágio sem esses conhecimentos superiores não revelados, esses mistérios e segredos que não fazem parte das minhas possibilidades.

E todos com maior ou menor grau de reflexão não convivem com essas incompreensões no dia a dia? Difícil não pensar em si mesmo daquilo que não convém, contrariando Paulo.




A Lua como um olho que tudo vê. 





Noite dessas novamente refletindo sobre esses segredos universais sem respostas, sobre a vida frágil, a Lua lá no alto com seu reflexo prateado, recebi uma pergunta mental provinda não sei bem de onde, mas que me causou vigorosa impressão interior e significado se me propuser a respondê-la apenas por mim. Esta:

- Mas, não está bom assim?

● ● ●

NADA SEI DE ESSENCIAL

Ah, meus caros, aqueles tempos

De (ir) responsabilidade e

Imortalidade...

Isso era o que eu sentia

A felicidade era em si mesma

Não percebida mas vivida,

Mas, o existir não é sempre assim

Os chamados da vida que um dia clamam,

Os dissabores até severos e os amores

Laços de família

Tudo vai vencendo, indo

Eis me aqui, agora, certo de minha mortalidade

Nestes tempos que… assustam.

Nada tem respeito, nem as florestas

Os animais que defendo,

Habito em mim mesmo

Miro-me no espelho fixo-me nos olhos,

O que há atrás deles, onde habito?

Então, sabendo da mortalidade

Tantos do meu tempo se foram, já.

Meu irmão, generoso!

Sou instruído que da vida o essencial ninguém sabe

Não explico sequer o sabor duma manga

Do espocar duma rosa,

Bato nas janelas opacas da minha habitação

Não há resposta

Apenas um tênue sentido de religiosidade

Na interioridade, nos sonhos...

Os sonhos o que são? 

Que interações há nos sonhos com vivos e... mortos

Bem, não me é dado ir além do que sou

Um simples mortal com os dias contados...

E depois?

Nada sei do essencial...

Referência no texto em prosa

(*) “A Fé Bahá’í é uma religião monoteísta fundada por Bahá’u’lláh, na antiga Pérsia, durante o século XIX, que enfatiza a unidade espiritual da humanidade. Não possui dogmas, clero, nem sacerdócio, mas estima-se que existam cinco a seis milhões de Baha’is espalhados por mais de 200 países. Os ensinamentos Bahá’ís atribuem grande importância ao conceito de unidade das religiões: a história religiosa da humanidade é vista como um processo de desenvolvimento gradual.” Mais informações, acessar: https://www.youtube.com/watch?v=nELmf0ZQSwM