03/05/2009

VERSOS PARA NINGUÉM (II)

A PERDA DA VEIA ROMÂNTICA

Ao se enveredar com alguma persistência para o estudo esotérico – que na verdade tem muito de auto-ajuda sem que isso se revele expressamente ou faça parte dos seus objetivos primeiros – mantém-se para sempre alguns conceitos que se leva pela vida. Eu acredito nisso e eu ainda carrego esses sintomas, embora hoje já não me dedique (tanto) a tais veredas.

Já disse – e se não disse, digo - que no campo da poesia tenho certa dificuldade em elaborar proposições românticas. É que num dado momento, obriguei-me a pisar no chão duro da sobrevivência profissional e, nesse passo, há sempre distorção de valores e desvios de prioridades.

Perde-se nesse mundo próprio a coragem pelo lirismo, e até mesmo em pronunciar a palavra ternura. Uma pena, porque os tempos não voltam. Por isso, admiro aqueles que conseguem superar esse antagonismo, obtendo refinada inspiração.

Então, do que escrevi ao longo do tempo e que consegui recuperar – porque o computador é ótima ferramenta até o momento em que uma pane descarta tudo, o bom e o ruim arquivados -, farei por temáticas, isto é, versos com semelhanças de enredo.

Seguem dois que tratam de indagações existenciais. O primeiro é completado pelo segundo:

Presente, passado e futuro

A tarde é cinzenta e fria. É outono
Bate forte o vento na janela entreaberta
Estas tardes melancólicas de sábado
me fazem viajar no tempo
E anoto quão ele é inexorável
de estação em estação.

Ligo o passado jovem com o presente
Sou eu mesmo, pena que sem mais
os projetos mirabolantes, belezas utópicas,
Sem mais as ilusões de mudar
com discursos o mundo,
Nem parece verdade todo esse trajeto.

Que posso dizer disso tudo, afinal?
Que tenho saudade do feito e do não feito?
Contabilizando os trens que passaram
sem que embarcasse?
Pelas oportunidades e o tempo desperdiçados?

Não sei bem o que sinto, na verdade.
Só sei que tal ligação passado-presente
Está aqui comigo, n’alma,
E me desperta a cada dia
Quem fui, quem sou e quem serei?

Quem sabe um idealista que queria
mudar com discursos o mundo,
Lamentando os trens perdidos
Que me levariam...para onde?
Olho do alto da maturidade
Serena e...mais além...
Lá serei uma lembrança remota
cuja presença se perderá no pó...

Inexorável!


Antigu-idade

Caminho olhando pra frente
Firme, busco compreensão sentida,
Dessa coisa que sacode ardente
Dessa centelha frágil chamada vida!

Mas, o que é isso tudo, afinal
Se a cada momento dado, há impostas
barreiras, desafios, sem prévio sinal?
Remexendo interiores, sem respostas?

Olho ansioso para o alto, então
Ouço a voz universal, tênue e piedosa
Sinto-me entre as estrelas, em solidão
Nada sei dessas luzes silenciosas!

Volto-me para mim, miro-me n’alma
Medito no todo dessa realidade (?)
Insisto em desvendar a centelha calma
Mas, apenas intuo que já vivo antiga idade...

2 comentários:

Caio Martins disse...

M'rmão,
há diferença substancial entre "romântico" e lírico. O primeiro assenta-se no ilusório, não importando técnicas e malabarismos. O segundo é essencial a qualquer composição, exige inteligência e sensibilidade. Tens essas características em tuas crônicas e poemas.

Raquel Pimentel disse...

Lindo meu tio! Adorei este seu lado romantico!! rsrs. Apesar de sempre sentir que ele existe só pelo modo que me abraça quando nos vemos.

Beijos com saudade!