Talvez eu esteja um tanto repetitivo nestas crônicas, explanando sobre a devastação ambiental. Se assim se dá é porque minha angústia atingiu limites do insuportável. Otimista por opção pessoal (“está tudo ótimo!”), sou pessimista, como já frisei antes, com o que poderemos passar ou os nossos descendentes enfrentar, com o que vimos assistindo no mundo no qual prevalece, imutável, o valor do dinheiro e não os prejuízos ambientais e de vida que ambição daquele impõe a estes.
Não me considero religioso na acepção do termo, tenho meus momentos de reflexão e outros de pura indiferença. Aqueles, porém, se sobrepões até por peso de consciência.
Já relatei, numa crônica de 20.09.2009, neste blog, “Intuição desvendada”, os significados de textos bíblicos à medida que, obtidos aleatoriamente os versículos, um grupo de alunos ia lendo e os interpretando, encontrando significados diferentes e até mais profundos do que aqueles normalmente aceitos.
Nunca me esqueci dessa experiência que vivi no meio termo da adolescência.
Por causa dela, vez por outra abro a Bíblia e vejo o que aparece. Nestes dias de sufoco pessoal abro em Romanos e lá está no versículo 5-3 e 4:
3. E não somente isso, mas também gloriemo-nos nas tribulações; sabendo que a tribulação produz a perseverança,
4. E a perseverança a experiência, e a experiência a esperança.
Assim sinto que tenho que perseverar na minha experiência e por todos os meios gritar: Esperança!
Mas, essa mensagem não me impediu de redigir a composição abaixo e, depois de escrita, abri de novo a Bíblia para algum aclaramento e eis que me deparei com o “Livro de Eclesiastes” e lá está a contundência na condenação à vaidade e, de certo modo, ressaltando a rotina da vida, como nestes versículos
2. Vaidade de vaidade! Diz o pregador, vaidade de vaidade é tudo vaidade.
3. Que vantagem tem o homem, de todo o seu trabalho, que ele faz debaixo do sol?
Considerando que o trabalho faz parte da vida e a vaidade a movimenta menos ou mais, tenho uma poesia cuja primeira estrofe:
TUDO É VAIDADE
Diz o Pregador, melancólico (?), realista (?):
"Vaidade de vaidade, tudo é vaidade"
Desta vida de serviço sem idade.
Da mais humilde à mais soberba criatura
A vaidade impulsiona o mundo, porém
Mas, no fim, nada restará senão o pó, o além...”
Essa a ressalva que faço em relação à vaidade e ao trabalho.
Porém, as coisas se modificam, por conta desse “trabalho” do modo mais preocupante, alterando até mesmo a rotina posta nesse capítulo bíblico.
Como estes que destaco:
4. Uma geração vai, e outra geração vem, mas a terra para sempre permanece.
6. O vento vai para o sul, e faz o seu giro para o norte; continuamente vai girando o vento, e volta fazendo os seus círculos.
7. Todos os ribeiros vão para o mar, contudo o mar não se enche: para o lugar para onde os ribeiros vão, para aí tornam ele a ir.
E por aí vai o texto bíblico, inclusive afirmando no n° 8 que “essas coisas se cansam tanto” e no versículo 9: O que foi, isso é o que há de ser e o que se fez, isso se tornará a fazer, de modo que nada há de novo debaixo do sol.
Hoje, com todas essas tragédias, todas essas degradações, os ribeirões vão para o mar? O mar não se enche? E o derretimento das calotas polares? O que têm provocado os giros do vento? As tormentas? As enchentes nunca vistas?
Esses ciclos rotineiros sugeridos pelo texto bíblico estão se modificando a olhos vistos, “os olhos não se fartam de ver”, pela ação devastadora do homem sob este sol.
Diante desses elementos, a composição a seguir, que pode até ser paciente mas muito pouco esperançosa.
IMPOTÊNCIAS
Sereno, medito neste meu canto
Uma avenca aos trinta anos me encara
Orquídeas sorriem e olhinhos delicados
Miram violetas roxas com ternura e encanto,
Estanco surpreso com essa beleza
As multicores irradiadas à tépida luz
A ela se integram e por isso exultam
Nesta plaga de recolhimento e singeleza.
Não me constrangeria se ali caísse em oração
Agradecido por aquelas existências reais
Sorrisos doces em oferendas, momentos de paz
Nestes tempos doentes, de guerras e destruição,
Transporto-me então para outra realidade, dura
Lá, tombam árvores, queimam-se florestas
O fogo desencadeia indescritível tragédia
Ceifando tudo, a vida, os bichos, a doçura
Exala de mim amarga tristeza e dor
Por clamar em silêncio, sem ouvidos
Ameaço gritar aos quatro ventos
Mas os sons se perdem em obscuro torpor,
Não reconheço esses ventos maculados
Sopram eles espíritos de tormentas assistidas
Neste fogaréu imenso de provações
Insensibilidades, ódios e odores desregrados,
Saberiam todos que este solo esgotado
Não haverá por muito como se refazer desses abusos
Apontando em riste e em lágrimas secas
Que pouco sobrará destes tempos abusados?
Resigno-me à minha impotência já tanto esquecido
Perante minhas poucas orquídeas, violetas e avencas
Intuindo no íntimo com angústia e melancolia
Que fenecem os tempos neste clima embrutecido.
Um comentário:
Caro dr. Milton: em tempo algum a questão ambiental nos preocupou tanto. Estamos assistindo à devastação do planeta. A humanidade irá se matar pela água... As doenças respiratórias já são uma constante em nosso tempo. E tudo o que nos resta é... Esperança! Parabéns pelo texto.
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