05/12/2010

PÁSSAROS

Os passarinhos, por instinto, fogem dos homens. Sabem que aqueles bípedes gigantes significam ameaça e perigo de crueldade.
Aqui do meu “escritório” de casa – já me referi a isso – muitas vezes fico assistindo esses pássaros avançando com apetite em fatias de mamão e banana postas sobre o muro. Mesmo à distância, bastou em gesto qualquer é eles esvoaçam com toda a pressa possível e, só depois, quando não notam mais a ameaça voltam para continuar a refeição.
Há algum tempo, num dia em que não me situava muito tolerante com tudo e com todos, chego até a loja de produtos de consumo animal e me deparo – como até hoje lá estão – aquelas gaiolas mal cuidadas com uma dezena de passarinhos massacrados entre as grades.
Perco a paciência e indago à atendente que sempre tão bem me atendia:
- Qual o preço de todos esses passarinhos?
- Deixa ver. Uns R$X.
- Tudo bem, levo todos. Coloque-os naquela gaiola ali que daqui a pouco volto para buscá-los. Vou soltá-los todos no parque...
- Mas, o senhor não pode fazer isso. Todos morrerão porque eles nasceram cativos e não sobreviverão na natureza.
Resigno-me, dou um soco na parede e me retiro contrariado. “Esse é o seu mundo, cara.”


Meu contato “íntimo” com passarinhos, pela sua desconfiança, foi mínimo. Já relatei a experiência com beija-flor quem sabe atraído pelo perfume do suco de uva, perdeu-se na sala e, por mais que fosse encaminhado para a saída, não conseguia sair. Batia no vidro, nas paredes, num ambiente que nunca seria o seu. Cansado se entregou. Com cuidado eu o peguei no chão. Um chumaço de penas. Olhinhos pretos esperando a vez como se estivesse sob as presas de um gato esfomeado.
Soltei-o e ele, talvez para recuperar o fôlego, empoleirou-se numa pinheiro por perto.

Mas, foi com um exemplar admirável de calopsita que me trouxe intimidade com um passarinho admirável, inteligente que “sabia o que queria”.
O exemplar pertence a um meu filho caçula, que ficou por uns tempos por aqui.
Sem poder voar porque suas asas foram cortadas – pelo mesmo motivo dos passarinhos engaiolados – com seus piados estridentes exigia companhia e, com aquele seu bico cortante andando pelo teclado do computador, quase cortou o fio do mouse e do próprio teclado.
Sempre de ombro a ombro, quando comigo, encarando-me com aqueles seus olhinhos pretos, seu topete amarelo empinado, havia algo de paz com sua presença. Algo inspirador, de inofensivo, de inocência, de anjinho.
A cena mais surpreendente deu-se numa tarde quando todos falavam na sala. Ele lá no canto, em sua gaiola aberta, piava alto reclamando por companhia, já que nós éramos suas asas. Não atendido nos seus apelos, sem nos ver, apenas o som das vozes porque a sala é em L, desceu da gaiola e com aquele penacho empinado, piando alto veio até nós, cerca de 12 metros até escalar os ombros pelos nossos pés.
E como assoviava bem acordes do hino nacional, repetindo sempre que atendido, a palavra que aprendera: “gotosinho”, “gotoso”
Ele vai fazer falta, mesmo exigente como era. Ah, se vai.

Passarinhos são um passatempo de Deus...


Todos se lembram do filme “O Pássaros” de Alfred Hitchcock de 1963, a história de milhares de pássaros que avançam sobre uma cidade e atacam violentamente os moradores. O filme pode ser interpretado de várias maneiras. Em 1963, bem me lembro, a ecologia não estava em voga, não havíamos chegado aos limites que chegamos neste século 21 de absoluto desrespeito ambiental a despeito das severas advertências do que está advindo desses atos insensatos e até um tanto suicidas.
Pois bem, o jornal “O Estado” do dia 21 de novembro, ilustrada com foto de quase meia página, trouxe a seguinte notícia, curta, em transcrição literal:
“Um bando de pássaros é flagrado pela fotógrafa Kaia Larsen, da AP, ao cercar um avião militar E-68 nos Estados Unidos. A imagem foi feita no dia 29 de outubro, mas só agora divulgada. O avião conseguiu pousar em segurança em Arkansas, e as aves o perseguiram até bem perto da pista. Não se sabe o que as fez ter esse tipo de comportamento.”
A notícia se encerra assim, desse modo lacônico. Que se saiba, não houve qualquer pesquisa para pelo menos “teorizar” o que fez as aves terem “esse tipo de comportamento”.
Os pássaros!

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