02/10/2011

O VÍCIO DE FUMAR (De quando o médico foi a vítima)

Não serei condescendente!
Muitos são os fumantes que atribuem ao cigarro que sustentam entre os dedos indicador e médio, amarelados pela nicotina, mero “habito de fumar”. (*)
Por favor, que hábito nada! É vício puro. Porque o fumante que um dia assume a luta para deixar de fumar é um sofredor: a fumaça do cigarro por perto o seduz ao penetrar em suas narinas, o cigarro por perto é a sua tentação irresistível. A abstinência para muitos e sofrimento tal qual qualquer outra droga.
Quanto a mim, em quantas reuniões empresariais naqueles dias em que o cigarro era “habito”, não saí delas com a roupa malcheirosa...e dor de cabeça.


Ao longo dos anos em que trabalhei na indústria automobilística, em duas delas, convivi com um mesmo médico – já devo ter me referido a ele em alguma outra crônica - que, sem nenhuma influência da profissão, tinha ideias interessantes.
Por exemplo: estudante que era de temas espirituais, fazendo até palestras e conferências, costumava dizer que há dois tipos de homens: o ser humano inteligente, subjetivo, intuitivo e o "humanóide", aquele objetivista, materialista que faz da vida, sobretudo, uma operação matemática.
Os subjetivistas, para ficar no menos, segundo ele, seriam aqueles que espontaneamente prestam atenção a uma árvore, na beleza de uma planta, de uma flor, na amizade de um cão, possuem interioridade onde cabem certos valores éticos dos quais não abrem mão. Poetas. Os outros, isto é, os "humanóides", mesmo com elevada cultura, olhariam uma árvore pelo seu valor econômico, são indiferentes a certas belezas que o mundo oferece, porque não mensuráveis economicamente, calculistas, monetaristas, mantendo apenas os princípios básicos daqueles mesmos valores éticos, porque vivem em sociedade e dela dependem. Pouca ou nenhuma “interioridade” possuem porque eles são do mundo e a ele pertencem. Preocupam-se em acumular riquezas como se fossem imortais.
Evidentemente que essa classificação feita pelo meu amigo médico é muito radical, porque todos nós temos nossas contradições, claro que alguns mais que os outros.
O homem é contraditório e ponto final. Claro que também esse médico, meu amigo.

Pois bem, esse médico era fumante. Para “negar” o seu vício, chegou mesmo a escrever um artigo no jornalzinho da empresa explanando sobre os perigos do fumo para a saúde, destacando os malefícios aos pulmões: "O grande problema não está na absorção da nicotina e sim na inalação dos demais produtos do fumo que realizam uma obstrução nos brônquios e alvéolos pulmonares trazendo portanto uma diminuição na circulação cardiopulmonar (chamada pequena circulação)", escrevera ele.

Alguns anos depois, recebendo proposta vantajosa de outra empresa, viu-se instado a fazer um exame radiográfico de rotina. A chapa revelou um ponto suspeito exatamente...nos seus pulmões.
A despeito dessa tumor, conforme se confirmou depois, foi admitido na outra empresa. Fez uma cirurgia, sendo necessário extirpar parte do órgão afetado. Recomendação básica de seus (colegas) médicos: jamais voltar a fumar !
Voltou à vida normal, com alguma moderação. Atendeu prontamente ao conselho vital: nunca mais fumou !
Que eu saiba, depois que abandonou o cigarro, nunca teve desejos secretos de fumar, nem "delírios" pela abrupta ausência da nicotina. Talvez porque houvesse agora uma imperiosa necessidade em largar o vício: a preservação da vida. Claro que cada um reage de uma maneira, mas como o cigarro reage igualmente sobre todos, fumantes e não fumantes, dia virá que tal vício será definitivamente uma postura anti-social, "marginal" (já não é?).
E nessa nova situação de sobrevivência, mais comedido, esse meu amigo viveu ainda muitos anos, tendo ainda prestado bons serviços à área de medicina do trabalho.
Tenho certeza que, esteja em que plano estiver, esse meu amigo não estará magoado pela confidência que agora faço sobre sua experiência. Porque, antes de tudo, ele não era um "humanóide", apenas um ser humano com suas contradições e fraquezas, como nós todos que, felizmente, apesar dos pesares, deixou de fumar e sobreviveu, certamente, alguns anos a mais.

Legendas:

(*) Esta crônica não é nova, mas não perdeu a atualidade. Já escrevi sobre o vício do cigarro no portal www.votebrasil.com e no blog http://martinsmilton2.blogspot.com (“A (in) tolerância ao tabagismo” de 14.06.2009)
(1) Cigarros Macedônia, velha marca, quebra-peitos e detonadores, como tantas outras, de milhares de pulmões
(2) Figura das drogas contidas no cigarro. Fonte: portaldoprofessor.mec.gov.br

(3) Imagem impressionante num maço de cigarros "Free" advertindo sobre os seus efeitos maléficos à saúde dos pulmões.

Um comentário:

Shirley Brunelli disse...

Não compreendo, como os fumantes, sabedores dos malefícios do cigarro, ainda continuam alimentando esse terrível vício. Perante Deus, isso é suicídio... Um abraço, Milton!